Belo Monte: mais um atropelo na legislação ambiental

Indígena do Xingu Foto Verena Glass
Em julho passado os responsáveis pelos estudos ambientais protocolizaram no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) o documento - “Estratégias para licenciamento ambiental”, com o fim de estabelecer estratégias para o Projeto Básico Ambiental (PBA) de Belo Monte. O PBA é o documento que apresenta programas e projetos para mitigar os impactos ambientais e sociais diagnosticados no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). A equipe técnica do Ibama analisa o PBA e confere, inclusive, se as condicionantes da Licença Prévia (LP) estão sendo observadas e contempladas no âmbito dos programas. Só com a aprovação de todo o PBA é que a Licença de Instalação (LI) poderá ser emitida.


Telma Monteiro


O PBA de Belo Monte já foi entregue ao IBAMA no dia 30 de julho e é o último passo dos empreendedores no caminho da obtenção da Licença de Instalação (LI) que autoriza o início das obras. No caso do processo da usina de Belo Monte, uma licença inédita está sendo criada. Desta vez chamaram de “Licença de Instalação das Instalações Iniciais” ou “Licença de Instalação da Infraestrutura de Apoio”. Não existe amparo legal para mais essa nova modalidade de licença fragmentada.


A justificativa desse novo atropelo na legislação ambiental é que duas licenças de instalação em seqüência seriam necessárias devido aos fatores sazonais da região e do cronograma de construção aprovado pela Aneel. Alguém entendeu? Mais ainda, sugere-se que dessa forma é possível “implantar o empreendimento em condições ambientalmente sustentáveis no que se refere aos aspectos socioeconômicos”. Dá para acreditar nessa conversa?


Já havíamos sido atingidos, em 2009, pela inventada “licença de instalação parcial” do canteiro de obras da usina de Jirau, no rio Madeira. Aliás, ela foi objeto de Ação Civil Pública do Ministério Público Federal. Agora, mais uma vez, a sociedade é surpreendida pela criatividade do governo para acelerar a concessão da LI e o início das obras de Belo Monte.


A primeira licença que o Consórcio Norte Energia está requerendo é para implantar a infraestrutura de apoio às obras e a segunda, para o resto. Qualquer engenheiro sabe que basta a primeira licença – da infraestrutura de apoio, para autorizar disfarçadamente mais de 70% dos impactos diretos das obras. Na verdade a licença de instalação da infraestrutura de apoio não passa de um engodo.


Ao chegar nesse ponto todo o estrago já foi feito – supressão de vegetação, vias de acesso, acampamentos, construção de canteiros industriais, terraplenagens, construção dos canteiros de obras, interferências nos igarapes – afinal os impactos ambientais reais são os iniciais e são eles que determinarão os impactos sociais e as alterações no ecossistema. Isso aconteceu em Jirau.


O consórcio aproveitou para inventar, também, dois Planos Básicos Ambientais (i) programas e projetos relativos às instalações iniciais e (ii) extensão desses programas e projetos com a inclusão de outros para o restante da área de intervenção do empreendimento.


O primeiro PBA pretende subsidiar a solicitação da LI da Infraestrutura de Apoio para (i) acampamentos dos diques e do Sítio Pimental (ii) acampamento e Canteiro Industrial do Sítio Belo Monte (iii) acesso viário interligando a BR 320 ao Sítio Pimental (iv) linha de transmissão para atender às obras (v) movimentação de terra no rio Xingu (vi) facilitar o acesso no canteiro do Sítio Pimental. O objetvio é implantar essa infraestrutura de apoio neste segundo semestre de 2010 e a concessão da licença ainda em agosto. E no primeiro semestre de 2011 pretendem-se dar início às demais obras.


Percebe-se que está tudo organizado, arquitetado para passar em cima de todos com um rolo compressor. Afinal Lula disse que tem que agilizar as licenças ambientais para as obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e temos uma Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixieira, que declarou isso, também. Então não faltaria mais nada. As datas já estão definidas e passar pelo crivo da equipe técnica do IBAMA é mera formalidade.


Fica a certeza de que não há programas ambientais que possam controlar os efeitos negativos das atividades construtivas de Belo Monte. Esses efeitos atingirão, na verdade, direta e indiretamente, 89.847 km² de terras indígenas (17,5% do território da bacia hidrográfica do Xingu) e 199.165 km² de Unidades de Conservação (UC) (39% da bacia). Além do que a bacia hidrográfica do Xingu é compartilhada por dois dos maiores biomas do país, o Cerrado, no alto Xingu e o Amazônico no médio e baixo Xingu.
Mas isso todos nós, pobres mortais, já sabemos!


Ações antecipatórias


No documento chamado “Estratégias para licenciamento ambiental”, a CNEC – Camargo Corrêa e a Leme – GDF Suez, empresas responsáveis pela elaboração do PBA, escreveram que “A Licença Prévia do AHE Belo Monte definiu a necessidade de que os Programas Socioambientais propostos no EIA e detalhados no PBA, incluam ações antecipatórias voltadas para importantes aspectos socioambientais a serem impactados, tais como: saneamento, aumento da demanda dos equipamentos de saúde e educação, migração.” Tentam fazer crer que a idéia seria do Ibama. É mentira.


Apesar da LP de Belo Monte conter essa condicionante, na verdade ela foi inserida por sugestão das empresas que concorreriam ao leilão, para “apaziguar” os ânimos dos movimentos sociais da região. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mandou incluir essa condicionante na LP. Não passa de um artifício para (i) antecipar desembolso e (ii) lançar mão da política do fato consumado.

Comentários

  1. É uma vergonha nacional a obsessão do governo do nonidáctilo pela destruição dessa natureza tão linda e necessária aos povos que ali habitam, que é a do Xingu. Pior que o governo da didatura é o atual, insensível e sorrateiro!

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