quarta-feira, 29 de junho de 2011

Usinas hidrelétricas no Brasil: matrizes de crises socioambientais

O Instituto Humanitas Unisinos – IHU apresenta a 39ª edição dos Cadernos IHU em formação, intitula da Usinas hidrelétricas no Brasil: matrizes de crises socioambientais. Atra vés da se leção de uma série de entrevistas com ambientalistas, estudiosos, pesquisadores e líderes comunitários das regiões envolvidas, a intenção do IHU é expor a reflexão atualíssima a respeito da realida de das usinas hidrelétricas no Brasil. O panorama é polêmico, pois as questões nele abertas são de interesse público e, em contrapartida, ferem determinados interesses particulares. Continue lendo Usinas hidrelétricas no Brasil: matrizes de crises ambientais...

São Paulo: passeata contra a usina de Belo Monte

Vídeo do emocionante protesto contra Belo Monte, na avenida Paulista, São Paulo, em 19 de junho de 2011. A sociedade está se engajando!

Energia eólica não é prioridade no Brasil

Divulgação: passeiweb.com

Planos de expansão ainda estão longe de aproveitar o potencial de 143 GW do país


As turbinas movidas pela força dos ventos são uma fonte limpa e renovável de energia, porém não constam como prioridade nos planos oficiais de geração energética, revela pesquisa do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE) da USP. A capacidade atual instalada é de 1 Gigawatt (GW), o que representa apenas 0,88% do total da energia disponível no Brasil.
O trabalho da pesquisadora Juliana Chade mostra que os planos existentes podem aumentar essa capacidade para 6 GW até 2019, muito abaixo do potencial eólico do país, estimado em 143 GW.
O plano decenal da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do governo federal, insere a energia eólica como alternativa ao atendimento da carga.


De acordo com Juliana, o custo do investimento pode ser a maior dificuldade para a inserção da energia eólica no Brasil:


- Mas os custos tendem a ser reduzidos com o aprendizado da tecnologia e os incentivos governamentais. Outra dificuldade seria a falta de histórico de medição de ventos, pois dados de medição de longo prazo conduzem a projetos mais eficientes e com menos risco de incerteza na previsão de geração.- Ele prevê uma capacidade instalada de aproximadamente 6 GW em 2019. Entretanto, o plano energético oficial, com horizonte até 2030, elaborado pela EPE, dá ênfase à geração térmica, ao gás natural, carvão e nuclear, como alternativa de complementação à geração hídrica - afirmou a pesquisadora.
A pesquisadora lembra que o Brasil conta com um histórico pequeno de tecnologia eólica e necessita treinar pessoas para manutenção e operação das usinas:
- É preciso uma estratégia de inserção de fontes eólicas por meio de pacotes de fornecimento com a progressiva nacionalização da cadeia produtiva. Além disso, deve haver mecanismos de mobilidade de ciência e tecnologia para desenvolvimento da infraestrutura e logística, com programas de incentivos tecnológicos, recursos humanos, pesquisa, materiais e componentes, a fim de se obter ganho de escala na indústria.

Alto potencial no Sul e no Nordeste



Segundo o Atlas do Potencial Eólico Brasileiro, publicado pelo Centro Brasileiro de Referência para as Energias Solar e Eólica (CRESESB) da Eletrobrás, o Brasil tem um potencial eólico de 143 GW, valor analisado em 2001, quando haviam menores torres e ventos a 50 metros de altura.
- Hoje há torres mais altas, o que aumentaria o potencial estudado. A Região Nordeste tem aproximadamente metade do potencial do Brasil. Outra região que se destaca é o litoral e o interior do Rio Grande do Sul, que apresentam as maiores velocidades de ventos para a geração de energia - afirma a pesquisadora.
A energia eólica é uma fonte alternativa de energia renovável, diferentemente das fontes térmicas de combustíveis fósseis, que, além dos custos com combustível, geram gases de efeito estufa.
- A eólica apresenta características de geração distribuída, o que reduz perdas na transmissão e a necessidade de investimentos de ampliação da rede - observa Juliana.
A pesquisadora acrescenta que existem fábricas de pás e turbinas eólicas no Brasil, apesar de alguns materiais serem importados para a construção dos parques.
- Nos últimos leilões de energia que contaram com fontes eólicas, em 2009 e 2010, houve uma maior participação da tecnologia e também uma redução em seus preços - completa. 
Fonte: Nosso Mundo

AGÊNCIA USP                                

Belo Monte: Hidrelétricas na Amazônia não produzirão energia limpa

    29. Junho 2011 - 12:54

Com o desmatamento começa o impacto ambiental de uma região muito vulnerável

Com o desmatamento começa o impacto ambiental de uma região muito vulnerável (Keystone)
Por Rosa Amelia Fierro, swissinfo.ch


O governo brasileiro acaba de dar luz verde à construção da terceira maior central hidrelétrica do mundo, no meio da Amazônia. Porém, o controvertido projeto Aproveitamento Hidroelétrica (AHE) Belo Monte não produzirá "energia barata e limpa" como se diz oficialmente.

Foi o que afirmou na Suíça a ambientalista brasileira Telma Monteiro.


“Ao contrario, causará impactos sociais e ambientais que jamais poderão ser mitigados ou compensados”, adverte Telma Monteiro, ambientalista  brasileira que participou da discussão A fome de crescimento do Brasil coloca em risco a sobrevivência da Amazônia e dos povos indígenas? As discussões ocorreram em Basileia, Zurique e Berna.

Com Belo Monte pretende-se produzir 11.233 MW de energia elétrica com as águas do rio Xingu, afluente do Amazonas. Ás águas serão represadas em dois lagos artificiais com superfície de 668 Km2, equivalente ao lago suíço de Constança.  Será a maior hidrelétrica em território nacional, já que Itaipu é binacional.

Segundo o governo brasileiro, 20 mil pessoas serão reinstaladas em Altamira. “Se calculamos os danos, ignorados nos processos,  de expropriação e privatização, não será possível pagar a fatura de eletricidade”, afirma Telma Monteira, convidada a vir à Suíça pela Associação para os Povos Ameaçados (APA).

A ativista explica que 50% da bacia hidrográfica do Xingu fica no estado do Pará e 50% em Mato Grosso.  “Cerca de 80% das águas serão desviadas por um canal artificial estreito para uma represa, o que significará que o curso d’água será limitado em uma distância de 100 km em Volta Grande, onde se encontra o grande arco do rio Xingu”.

Ser humano e ecossistema afetados

Trata-se de um projeto insano, insiste Monteiro. “Porque o Xingu é um rio estacional e alguns meses tem pouca água.  Enquanto o trecho de 100 km estiver seco quatro meses, outra parte estará sempre inundada”.

Especialistas concordam que Belo Monte afetará a dinâmica do ecossistema da região, sem contar que a estacionalidade do rio impedirá a produção da energia calculada.

O projeto também provoca conflitos porque algumas comunidades estão a favor e outras contra. “Esses grupos são pressionados, manipulados e instrumentalizados pelas construtoras em uma situação complexa”, lamenta a ambientalista.
 
“Organizações brasileiras já apresentaram o problema da violação dos direitos humanos das populações indígenas à OEA, à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos e à ONU”, explica Telma Monteiro.

Mais usinas na Amazônia

De acordo com Monteiro, os projetos hidreléctricos são parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “O Ministério das Minas e Energia acaba de apresentar o Plano Decenal de Energia: somente entre 2016 e 2020 serão construídas dez usinas na Amazônia, principalmente em terras indígenas e em rios importantes como Tapajós e Jamanxim, no Pará”.

A FUNAI, Fundação Nacional do Índio, declarou que Belo Monte era uma ameaça por está em uma região vulnerável, cercada por territórios indígenas: a principal represa está a menos de 70 km, assinala Monteiro.

Ela afirma que o licenciamento de Belo Monte foi repleto de irregularidades. Em 2000, quando se decidiu pela viabilidade de Belo Monte, o Ministério Público começou a atuar contra essas irregularidades.

Inicialmente, Belo Monte custaria 19 bilhões de reais; depois falou-se em 25 bilhões, 30 e agora 35 bilhões, dos quais 80% será financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES).

Telma Monteiro e Christoph Wiedmer, em Berna, capital suíça
Telma Monteiro e Christoph Wiedmer, em Berna, capital suíça (swissinfo)

Brasil tem problema com os índios

Na discussão em Berna, Christoph Wiedmer, diretor da seção suíça da Associação para os Povos Ameaçados ( APA) disse que a autorização de construir do governo brasileiro “é contrária à exigência expressa na Declaração de Direitos dos Povos Indígenas de consentimento livre, informado e prévio no processo decisório”.

A APA suíça, juntamente com associações similares da Alemanha, Áustria, Itália e a Associação para os Povos Ameados na ONU lançam um apelo ao governo brasileiro para a suspensão de Belo Monte.

Em carta à presidente Dilma Rousseff, as associações lembram que a Declaração de Direitos dos Povos Indígenas da ONU exige que, antes do início de qualquer projeto que possa ter impacto, deve ser obtido o consentimento dos povos direta ou indiretamente afetados.

“Até este momento, porém, tem feito audiências somente com alguns dos povos indígenas afetados”.

Segundo a APA, embora o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis tenha encontrado apenas cinco dos 40 requisitos de compatibilidade ambiental e social necessários, o governo brasileiro aprova a construção.

Além disso, “pressiona os críticos do projeto: a FUNAI negou ao representante indígena Azelene Kaingan uma permissão para assistir ao Fórum Permanente para Assuntos Indígenas, em Nova York. O consórcio Norte Energia, responsável pela construção, tentou retirar do Ministério Público Federal a queixa feita pelo procurador Felício Pontes”.

 Para a APA, Belo Monte “é uma oportunidade para o Brasil provar sua capacidade de desenvolvimento com respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos”.

Projetos em outros países

Segundo Telma Monteiro, 80% da energia no Brasil provém das hidrelétricas. “Temos três reatores nucleares e o governo pretende construir mais quatro no nordeste. No entanto, está previsto apenas um aumento de 1,5% de energia eólica até 2015 e 3% até 2030”.

A construção de usinas elétricas na Amazônia não se limita ao território brasileiro. Empresas brasileiras têm outros projetos no Peru (Inambari) que já está em processo de licitação, e na Guiana.

Todos são financiados pelo BNDS e são parte do Planejamento Energético Brasileiro, “que não corresponde à demanda do mercado, apenas cria oferta. Parte da ideia de um grande crescimento, mas não melhora a tecnologia nem a economia de energia. Só na transmissão perde-se 20% da energia, quantidade que corresponderia à produção de uma usina da dimensão de Belo Monte”, afirma Monteiro.

A ativista falo una Suíça que está convencida das vantagens de outras formas de produzir energia. “Segundo o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual, o vento da costa brasileira pode produzir 60% da energia que o Brasil necessita. Não nos opomos ao crescimento e ao desenvolvimento, desde que seja sustentável”, conclui. 


Rosa Amelia Fierro, swissinfo.ch

terça-feira, 28 de junho de 2011

Belo Monte: Carta à Presidente Dilma, crônica de Paulo Sanda

Kaiapó encaminha carta à presidente Dilma Rousseff
Divulgação: correiodemocratico.com.br

Publicado em junho 28, 2011 por HC

[EcoDebate] Outro dia eu estava conversando com o sr. Anivaldo Padilha, o pai do ministro da saúde Alexandre Padilha.
Ele me falava da grande alegria que foi ver a senhora presidente subindo a rampa do planalto, como a primeira mulher a assumir a presidência da república no Brasil.
Ele ainda se lembra vivamente da dor e da tristeza, que compartilhara com vossa excelência, quando as únicas pessoas que tinham para conversar eram uma ao outro, em suas celas vizinhas em São Paulo, na época da ditadura militar.
Ambos, vítimas de um sistema que oprimia e matava quem discordasse dele.
Foram anos difíceis de muito choro e revolta, tanto para a senhora presidente como para muitas outras pessoas, que acreditavam na liberdade.
Ainda choro e fico indignado quando ouço os relatos.
Mas vejam, as pessoas que o faziam, acreditavam estar agindo corretamente, este era o sistema, na visão delas, estavam cumprindo seu dever.
Não estou dizendo que estavam corretas, nem que o que faziam não era abusivo.
Certamente, nada pode justificar a violência e a injustiça que reinavam naquela época.
Mas o Brasil está progredindo.
As minorias estão paulatinamente conquistando seus espaços.
Tivemos um homem do povo na presidência e agora temos uma mulher.
Mas veja só.
Na época das bandeiras, que foram explorar o interior do Brasil em busca de ouro e pedras preciosas, matar índios era a coisa uma coisa tranquila, eles não eram sequer considerados gente.
Depois ainda na primeira metade do século XX, quando saiu a expedição Roncador Xingú, matava-se os índios que ameaçassem os homens dela. Mas graças a conscientização em relação aos direitos humanos, personalizada neste caso em nossos grandes sertanistas os irmãos Villas Boas, que repetiam o lema do Marechal Cândido Rondon, “Morrer se preciso for, matar jamais”, que recusavam a matança de índios. Os massacres foram contidos.
Então, não é mais aceita a matança dos indígenas, apesar que ainda acontecem.
Mas condenar milhares deles a morte, lenta e sofrida pela perda de sua cultura e seu modo de vida, para construir a usina hidroelétrica de Belo Monte, é aceito.
O mesmo raciocínio vale para os pequenos agricultores da região. A poucas décadas atrás ou até a poucos anos atrás, os agricultores, padres, missionários, sindicalistas eram mortos em conflitos de terra. Na época eram usados pistoleiros.
Eles continuam a serem usados, mas agora foram acrescidos de tratores e caminhões, que construirão um monstro para dizimar definitivamente estas pessoas.
Assim Dilma, por favor me permita esta intimidade de referir-me a senhora sem usar os títulos, pois agora quero falar a pessoa, a mulher, a jovem que um dia estava presa e sendo torturada por pessoas absolutistas, que negavam o direito das outras, caso estas fossem contra elas.
Então Dilma, peço humildemente que olhe para as pessoas, para os índios que estão sendo oprimidos. Imploro que não deixe que construam a imensa cela que aprisionará o rio Xingú e as vidas de tantas pessoas.
Rogo que voltemos, e pensemos em projetos que sejam mais humanos.
Os recursos naturais vão se esgotar, e quando se esgotarem, nada sobrará.
Dilma, você pode ser mais que a primeira mulher a assumir o cargo mais importante do Brasil, você pode ser a pessoa que mostrará visão. Preservará a vida e a natureza e fará com que o Brasil, frente a um mundo devastado, tenha ainda seus mais preciosos tesouros. Sua grandiosa fauna e flora, a rica cultura indígena, ribeirinhos e pequenos agricultores vivendo em harmonia com a natureza e produzindo alimento tão necessário para todos nós.
Sei que a luta não é fácil, quer dizer, imagino. Pois não seu eu quem tem esta grande responsabilidade, mas você.
Mostre que uma mulher pode agir de forma diferente, do que sempre foi o poder nas mãos dos homens brancos e ricos.
Assuma isto de forma pública e tenha certeza, terá grandes e fieis defensores, assim como é o sr. Anivaldo Padilha.
Paulo Sanda é Teólogo, chefe escoteiro, palestrante, idealista, associado da ONG RUAH e tem sido ativo participante das manifestações Belo Monte NÃO, em São Paulo. RUAH – Desenvolvimento Integral do Ser Humano
EcoDebate, 28/06/2011

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Obras provocam redução de unidades de conservação

Karina Miotto

Crédito: WWF-Brasil/Adriano Gambarini
Em benefício da construção do Complexo Tapajós, em sua totalidade composto por seis usinas hidrelétricas, o governo federal decidiu reduzir o tamanho de cinco Unidades de Conservação (UCs) na bacia do rio Tapajós, no Pará. A informação foi divulgada pelo Instituto Socioambiental (ISA). A decisão deve afetar os parques nacionais (PARNA) da Amazônia e do Jamanxim, as florestas nacionais (Flona) de Itaituba I e II e a área de proteção ambiental (APA) do Tapajós. No total ficarão desprotegidos e poderão ser inundados 78 mil hectares, o equivalente a 78 mil campos de futebol ou uma área maior do que a cidade de Salvador, na Bahia.

Tapajos - Áreas de UCS a serem inundadas. Fonte: ISA (Clique para ampliar)
A medida veio para permitir o licenciamento e a implantação de três das hidrelétricas do Complexo: São Luiz do Tapajós (6,1 mil MW de potência instalada), Jatobá (2,3 mil MW) e Cachoeira dos Patos (272 MW). Conforme comunicado oficial do ISA, esta "foi a solução encontrada para driblar a lei, que dificulta ou proíbe a construção de usinas em unidades de conservação que devem ser atingidas". A decisão pode se tornar oficial em julho por meio de projeto de lei ou Medida Provisória (MP).

Rômulo Mello, presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), chegou a afirmar que este é um "procedimento normal", pois deve ampliar ou criar novas áreas como compensação, sem atentar ao fato de que, agindo desta forma, o Brasil adiciona novos elementos ao retrocesso de sua legislação ambiental (vide aprovação do novo Código Florestal pela Câmara dos Deputados, o que já tem impulsionado a redução de florestas).  A área que deixará de contar com proteção ambiental é rica em biodiversidade. Para Eduardo Góes Neves, professor da Universidade de São Paulo (USP), a construção do complexo no rio Tapajós é extremamente preocupante, pois pode destruir sítios arqueológicos. "Uma catástrofe", diz. "Os lagos gerados pelas barragens inundarão parte das unidades de conservação do mosaico da BR-163, além de alagar parte da BR-230, o que gerará mais desmatamentos, para realocar parte das rodovias. O complexo vai atingir o maior mosaico de unidades de conservação do Brasil, criado para barrar os desmatamentos. É muita incongruência", afirma Maria Lúcia Carvalho, gestora do Parque Nacional da Amazônia. O impacto das seis usinas também pode atingir os povos indígenas das terras Munduruku, Saí Cinza e Apiacás. 

Por trás dos Complexos

Gráfico de criação de UCS no Governo Lula. Fonte: ISA (Clique para ampliar)
Telma Monteiro, pesquisadora e especialista em questões que envolvem a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, elaborou um estudo no qual afirma que uma das maiores motivações do governo federal em construir o Complexo Tapajós (e também o de Teles Pires, no Mato Grosso, com cinco usinas) é um conjunto de acordos referentes ao gerenciamento de águas, biocombustíveis e logística portuária firmados, desde 2008, entre Brasil e Holanda. "Junto a esses complexos hidrelétricos estão em andamento projetos de hidrovias que só poderiam ser viabilizadas com a criação de grandes reservatórios nos trechos naturalmente intransponíveis, de pedrais ou encachoeirados, característicos dos rios da Amazônia", afirma. 

Um exemplo é a Tapajós-Juruena-Teles Pires, desenvolvida pela Administração das Hidrovias da Amazônia Oriental (AHIMOR) e que deve possuir 20 mil quilômetros de malha hidroviária navegável só na região amazônica. Por um lado, no Brasil, ela seria utilizada para promover o comércio exterior de commodities do Mato Grosso (como grãos e biocombustíveis) e do Pará (minério). Por outro, de acordo com a pesquisadora, o Brasil "é o mais importante mercado emergente no mundo e imprescindível para manter a estratégia de crescimento das exportações holandesas para a América Latina". O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) prevê a construção de 36 terminais hidroviários na Amazônia. 21 já estariam em obras e 15 em estágio de licitação.

UCs em perigo 

Reduções ou mudança de categoria em Unidades de Conservação motivadas por fins políticos e econômicos têm acontecido em outras regiões da Amazônia brasileira. No dia 9 de maio deste ano a Lei Estadual nº 3.602, publicada no Diário Oficial do Estado do Amazonas, transformou o Parque Estadual Nhamundá, na divisa do Amazonas com o Pará, de proteção integral, na Área de Proteção Ambiental (APA) Guajuma. A alteração, a partir de agora, permite a passagem do Linhão de Tucuruí, que vai levar energia elétrica do Pará até Manaus - o que era proibido antes. 

Além disso, conforme afirma Rita Mesquita, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), "parte do parque estava comprometido por ocupações de fazendas de gado e existe um interesse minerário grande na área. Como APA estes problemas acabaram. Do jeito que foi feito, o Parque desapareceu, as novas áreas previstas, inclusive já tendo passado por consultas públicas, não foram criadas e uma biodiversidade ameaçada ficou a ver navios. Isso sem falar das comunidades, que certamente cederão, no devido tempo, seus lugares de vida à expansão da pecuária dos outros".  

Ainda no Amazonas, a Assembleia Legislativa autorizou em dezembro de 2010 a mudança de categoria do Parque Estadual do Rio Negro Setor Sul em Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS). "Com a transformação e considerando o processo de invasão, o Sauim de Coleira, espécie endêmica e ameaçada, estará fadado ao desaparecimento. O assunto é complexo, mas pode ser resolvido de modo que todos ganhem: comunidades ribeirinhas, indígenas, recursos naturais e especialmente o Sauim", afirma Rita. 

Em Rondônia, em julho do ano passado a assembleia do estado revogou sete unidades de conservação - mais de 973 mil hectares ficaram desprotegidos. Enquanto isso, em Roraima e no Amazonas ainda persiste a polêmica pela criação da Reserva Extrativista (Resex) Baixo Rio Branco-Jauaperi, de 600 mil hectares. A região é considerada prioritária para Conservação pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) por ser dona de rica biodiversidade, mas o processo de sua criação já totaliza dez anos, está finalizado, parado e até agora não saiu do papel por se tratar de um local rico em recursos madeireiros e, portanto, em conflitos de interesses. "Em abril, em Parintins, a ministra do meio ambiente Izabella Teixeira prometeu criar a Resex na semana do meio ambiente e mais uma vez nada foi feito", afirma Carlos Durigan, da Fundação Vitória Amazônica (FVA). Esta mesma promessa já teria sido feita outras vezes.  

Por pressão de madeireiros, fazendeiros, mineradores e do governo, 29 áreas protegidas na Amazônia foram reduzidas ou extintas entre 2008 e 2009. O total de florestas perdidas foi de 49 mil km2. De acordo com estudo divulgado em maio pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em dezembro de 2010 as áreas protegidas na Amazônia Legal representavam 43,9% da região e somavam 2.197.485 km². Do total de UCs, apenas 24% possuem planos de manejo aprovados. Em média existem dois funcionários por unidade, cada um responsável por gerir quase 2 mil km².  

Conforme comunicado oficial do próprio MMA, unidades de conservação "desempenham papel crucial na proteção de recursos estratégicos para o desenvolvimento do país e contribuem para o enfrentamento do aquecimento global. Além de serviços ecossistêmicos, como garantia de água para a população e para diversas atividades produtivas, podem gerar benefícios lucrativos e atividades produtivas para populações tradicionais". O discurso, no entanto, não tem sido acompanhado por ações equivalentes.



Karina Miotto é jornalista ambiental formada pela PUC-SP. Apaixonada pela Amazônia, mora na região desde 2007. Já trabalhou para o Greenpeace e escreveu para revistas da Editora Abril, entre elas National Geographic. Karina acredita no poder da informação para transformar vidas positivamente - inclusive a do planeta. É autora do blog Eco-Repórter-Eco e correspondente do ((o)) eco Amazonia.


domingo, 26 de junho de 2011

Belo Monte: energia DA Idade da Pedra

Desenho: focofelicidade.blogspot.com

Reescrevendo o artigo "Energia na Idade da Pedra", de Delfim Netto, de 26 de junho de 2011, para a Carta Capital

Telma Monteiro

As campanhas para impedir a construção de Belo Monte, no rio Xingu, não têm a pretensão apenas de preservar a integridade da Amazônia, mas também a dos seus povos e culturas. Apesar de o projeto estar sob o foco do governo há quase 30 anos, não se levou em conta todas as implicações importantes para a sobrevivência dos ecossistemas da região. Combater a construção de Belo Monte não significa querer voltar para a Idade da Pedra em busca da escuridão e desdenhar a energia em nossas vidas.  Temos apresentado fundamentos científicos de alternativas a Belo Monte que não estão sendo discutidas ou avaliadas pelo governo.

Sabemos como exatamente uma usina hidrelétrica – na Amazônia, no Vale do Tenesse, nos EUA, ou Três Gargantas, na China – modificam para pior o ambiente físico. Somos também conhecedores de como esses processos foram impostos à sociedade desses países. Nossa vivência de atuação no acompanhamento do desenvolvimento energético brasileiro mostra que as mudanças – não são teses defendidas por ecochatos ou radicais, mas por cientistas – são sempre negativas sob todos os aspectos desde a flora e fauna até os seres humanos, principalmente.

O aproveitamento do potencial hídrico envolve, concordamos, uma enorme gama de questões que deveriam ser tratadas sob prisma diferente: energia é essencial para a sobrevivência do homem e o funcionamento da economia. A questão é como essa energia é gerada, para quem ela está direcionada e até que ponto nos é imposta sem a necessária transparência quanto à demanda projetada. Lógico que as sociedades têm que capturar a energia que está dispersa em seu ambiente e depois dissipá-la na produção de bens e serviços. Mas as perguntas que fazemos são: quais os bens e serviços que seriam beneficiados efetivamente por essa energia gerada à custa da destruição do bioma amazônico e qual seria o modelo a ser seguido que nos obrigaria a isso? Alternativas ao modelo de desenvolvimento requerem diálogo com a sociedade, informações sobre o que o futuro lhes reserva em termos ambientais e sociais e consentimento prévio, livre e informado dos povos indígenas afetados. Quais os custos que uma única rota para um processo de desenvolvimento econômico pode ter? Sim, os homens escolheram a sua forma de vida, mas isso não significa que agora - depois de 150 mil anos - não possam repensá-la e ajustá-la diante de novos parâmetros ou de novos valores que a evolução e o conhecimento fizeram sugir.

As manifestações que têm pontuado as campanhas contra Belo Monte não demonstram, em hipótese alguma, que se pretende uma volta à vida na caverna, dispensando o conforto ou as coisas boas da vida. Manifestantes querem ter energia suficiente para iluminar seus lares, movimentar seus eletrodomésticos, seus aparelhos eletrônicos, promover a sua locomoção – de preferência com transporte público decente, o que lhes é negado em todas as cidades do Brasil. Mas para isso reivindicam que a forma de suprir a energia para essas necessidades seja rediscutida, que gerar energia não seja simplesmente construir barragens que beneficiam apenas umas poucas empresas poderosas e sabidamente depedentes de obras do governo. Não querem mais essa fórmula. Não se vê BMWs nas garagens de ambientalistas e sim nas dos políticos e empresários.

Apesar de os "bem-intencionados ambientalistas" empolgados e sérios admitirem sempre que se beneficiam dos recursos modernos e acesso às novas tecnologias, eles se sentem agredidos, inconformados com o fato de que tudo isso venha de fontes não renováveis. O custo é alto e apenas aqueles, os "bem-intencionados", minoria da sociedade, sentem que é preciso forçar uma mudança de atitude e questionar esse consumo incentivado pelo governo que, na verdade, vai exigir cada dia mais energia para ser suprido. Os indígenas, nas terras no entorno das obras de Belo Monte, os habitantes de Altamira não reivindicam participar do empreendimento, eles na verdade reivindicam aquilo a que têm direito sem a hidrelétrica: a qualidade de suas vidas e a renda justa das famílias. Proporcionar isso seria o papel do Estado e das políticas públicas que inexistem e acabam abrindo a brecha para que a iniciativa privada chantegeie a população com ofertas mirabolantes de bem estar.

Os urbanóides são cidadãos também e como tal devem ser tratados, e as lideranças indígenas do Pará estão bastante bem informadas sobre o futuro que os espera no caso de Belo Monte e sabem a verdade sobre os resultados de empreendimentos como o Projeto Carajás, Tucuruí e Estreito, no rio Tocantins. Não dá mais para ocultar os cadáveres ambientais que estão conspurcando a história da região. Esses empreendimentos que tiveram contrapartidas de exigências de preservação ambiental, ditas severas, na verdade, não foram cumpridas e deram espaço à putrefação e ao ranço muito bem retratados no artigo do distinto ex-ministro Delfim Netto. Ele deve lembrar bem das negociações com o Banco Mundial numa época em que famosos 10% eram reservados para os "bons" negócios.

Como exige a lei, hoje, nenhum investimento em hidrelétricas ou outras obras do PAC de Lula e Dilma poderia ser aprovado sem levar em conta medidas de segurança máxima – que se revelam mínimas. Compensações e condicionantes estão sendo usadas como rótulos de sustentabilidade para projetos inviáveis econômica e socialmente. A questão ambiental – não problema ambiental – deveria ser parte explícita dos custos tanto do projeto como do produto a ser gerado: a energia. Os verdadeiros custos – ambientais e sociais presentes e futuros – deveriam ser mensurados e incorporados. Aí sim, saberiamos quanto realmente custa a energia que nós é ofertada.

Defender a consolidação de uma matriz energética limpa, confiável e ronovável, sem utilizar o potencial hídrico da Amazônia é uma questão de sobrevivência da espécie humana. Marcelo Corrêa, diretor – presidente da Neo Energia, empresa que começou a construir Belo Monte disse, citado por Delfim Netto, que as usinas do Madeira, Belo Monte e Teles Pires, representam um paradigma no modelo energético brasileiro. Esse paradigma, ao contrário do que eles querem fazer crer, está marcado pela não observância da legislação ambiental, pelo não cumprimento das medidas antecipatórias e das condicionantes. O projeto de Belo Monte, em especial, não tem critérios confiáveis e nem suficientes de mitigação para os efeitos socioambientais, não beneficiará as populações das respectivas regiões ou a população brasileira, pois esse potencial energético é um engodo e uma região já muito sacrificada pelo descaso de décadas de políticas públicas de "coronelismo explícito", mais uma vez vai ficar sem o esperado desenvolvimento.

O futuro de Belo Monte está aí, agora, como mostra o exemplo maléfico das usinas do rio Madeira, em Rondônia.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Ataque ao coração da Amazônia

Esta é uma matéria publicada na Suiça sobre uma das minhas palestras sobre Belo Monte e os planos do governo para a Amazônia.

News


© Foto by Ruedi Suter, OnlineReports.ch


"Eine Attacke auf das Herz Amazoniens"

Brasiliens Zukunft liegt für die Regierung im Amazonas, dieser Wildnis mit den riesigen Wäldern, Flüssen und Rohstoffvorkommen. Wie die Zukunft bald zur Gegenwart werden soll, darüber sprach heute Montagabend Telma Monteri im Basler Institut für Soziologie. Im Zentrum stand der projektierte Riesenstaudamm Belo Monte, der ab 2015 Strom liefern soll.
Basel, 6. Juni 2011

Die aus Brasilien angereiste Spezialistin zur wirtschaftlichen Entwicklung des Amazonas zeigte anhand von Karten, wie der Urwald zum Wohle des Landes, ja des ganzen südamerikanischen Kontinents baldmöglichst "umgestaltet" werden soll. Mit zahlreichen Staudämmen, worunter jener von Belo Monte, diesem eben bewilligten drittgrössten Wasserkraftwerk der Welt am Xingu-Fluss. Aber auch mit neuen Land- und Wasserstrassen, mit Minen für die Gewinnung von so wertvollen Stoffen wie beispielsweise Gold, Bauxit, Eisen und Aluminium, mit breitflächigem Holzschlag und grossen Plantagen für Palmöl, Soja oder Agrotreibstoffe und weiteren Gewinne versprechenden Plänen mehr. Klar, dass der Fortschritt auch neue Städte aus dem Boden schiessen lassen würde, mit mehr  mehr Menschen, mehr Flächenbedarf, mehr Verkehr.

Ein wahres "Wachstumsbeschleunigungsprogramm" habe die Regierung in Brasilia ausgeheckt, berichtete Telma Monteri (Bild). Vorab für die bewaldeten Bundesstaaten Pará und Matto Grosso, in die Milliarden Dollar investiert und von denen weite Teile unter Wasser gesetzt werden sollen. Doch begeistert ist die  Brasilianerin in keiner Art und Weise. Sie ist nach Europa gereist, um hier Parlamente und Bevölkerungen zu sensibilisieren. Und zwar gegen die für sie und viele internationalen Organisationen als "wahnwitzig" eingestuften Pläne. Die Klimaerewärmung aufgrund der Waldvernichtung nannte Monteri nie, dafür aber die Menschenrechtsverletzungen an den indianischen Urvölkern, von denen etliche immer noch in freiwilliger Isolation (Indigenas em isolamento voluntario) lebten und nicht gestört werden wollten.

Keine Chance ohne internationaler Beistand

"Was heute geschieht in Brasilien, ist eindeutig gegen die Indigenen gerichtet", erklärte Monteri in ihrer sanften Art. Die Waldvölker hätten keinerlei echte Mitsprache- noch Entscheidungsrechte. "Diese Projekte basieren alle auf Enteignung und Privatisierung", kritisierte die Brasilianerin mit dem Hinweis, dass 90 Prozent des Kapitals von brasilianischer Seite bereitgestellt würde. Und ihr Gastgeber, Christoph Wiedmer, Geschäftsleiter der Gesellschaft für bedrohte Völker (GfbV), Schweiz sekundierte: "Es geht hier um das Herz des Amazonas. Wenn dort die Zerstörung Fuss fasst, wird sie sich rasch über den Rest des Amazonas-Waldes ausbreiten." Ohne internationale Unterstützung, da sind sich Monteri und Wiedmer einig, seien die oftmals isoliert lebenden Indigenen dem Ansturm der Konzerne und Regierungsorganisationen hilflos ausgeliefert. Dies zeige allein schon die Ermordung verschiedener brasilianischer Umweltschützer und Menschenrechtler in den letzten zwei Wochen.

Zur Erinnerung: Im Gliedstaat Pará wurde das Ehepaar José Cláudio Ribeiro da Silva und Maria do Espírito Santo Silva umgebracht, beide Regenwaldschützer. Erschossen wurde in der Nähe des getöteten Ehepaars überdies der Kleinbauer Marcos Gomes da Silvia, der sich gegen Ausbeutung  zu wehren versuchte. Und im Teilstaat Rondônia starb Adelino Ramos, ein Aktivist der Landlosen, an einer Kugel. Morde oder massive Einschüchterungen gehörten zum Alltag jener Menschen im umkämpften Amazonas, die sich gegen die vorrückenden Konzerne und Grossfarmer zur Wehr setzten, sagte Telma Monteiro. Laut der Neuen Zürcher Zeitung wurden allein 2010  34 Umweltschützer und Menschenrechtler ermordet. Nun hat die Regierung letzte Woche Militäreiheiten in die Region geschickt und 165 mit Morddrohungen konfrontierte Menschen unter Polizeischutz gestellt.

"Ein zerstörter Amazonas trifft alle"

"Unsere Hoffnung für einen Gesinnungswandel der Regierung", schliesst Telma Monteri tapfer lächelnd, "ruht auf der immer noch möglichen Einsicht der Staatengemeinschaft, dass die Auswirkungen eines zerstörten Amazonas alle treffen würden." Deshalb versuche sie zurzeit in Europa zu schildern, was den Amazonaswäldern Unwiderbringliches drohe.

Die Brasilianerin kann sich der Unterstützung von 53 Organisationen aus Deutschland, Österreich und der Schweiz sicher sein. Diese schrieben im Mai einen Brief an die leitenden Verantwortlichen von Alstom Schweiz im aargauischen Baden, Andreas Koopmann und Philippe Joubert, mit dem Appell, sie müssten ihr Engagement für Belo Monte aus ethischen Gründen zurückziehen. Alstom Power soll am 9. Februar 2011 mit der brasilianischen Firma Norte Energia einen Vertrag für Energieanlagen im Wert von 500 Millionen Euro unterzeichnet haben.

Ob sich damit und mit ähnlichen Aktionen die auf den Amazonas und seine Urvölker zurollende Walze brachialer Entwicklungen bremsen oder gar stoppen lässt, muss  allerdings in Frage gestellt werden.

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