terça-feira, 18 de outubro de 2022

Palco iluminado ou são só o que temos para hoje?

Imagem: Pngtree

Telma Monteiro

Eu realmente não entendo essa necessidade de transformar um debate entre dois candidatos à presidência do Brasil em um show, um espetáculo de luzes e cenários. Ao colocar no palco dois indivíduos que se odeiam e na iminência de se agredirem fisicamente, além de desconectados com o verdadeiro Brasil, a mídia tem sido incapaz de apresentar jornalistas com capacidade de elaborar perguntas e transformar essa contenda em questões que os brasileiros merecem ver respondidas sobre o seu futuro.

Só falar sobre o passado avassalador e putrefato, sem que o futuro seja objeto da verdadeira motivação de estarem ali. O objetivo, na verdade, é o espetáculo e a torcida evidente para que o pior aconteça, ou melhor uma exposição ainda mais negativa dos candidatos. Lamentável que a classe de jornalistas, emissoras de TV, Youtube, rádios, portais, se unam no único propósito de medir audiência. Não estamos tratando de um ringue de luta livre ou box, estamos tratando do futuro das gerações de jovens brasileiros que estão sendo levados a acreditar que votar é apenas uma obrigação, estamos tratando de democracia e que aqueles sujeitos que estão no palco iluminado, infelizmente, são só o que temos para hoje.

quinta-feira, 29 de setembro de 2022

MANIFESTO PELO MEIO AMBIENTE E PELA DEMOCRACIA

MANIFESTO PELO MEIO AMBIENTE E PELA DEMOCRACIA

 

Imagem: Climainfo

Atualizado em 03 de outubro de 2022

Os brasileiros estão vivendo um momento difícil. Forças retrógradas empurram um país promissor e formado por um povo valente e dócil para o caos. Nós somos livres e essa liberdade custou muitas vidas ao longo da história. Neste momento essa liberdade e a democracia estão em xeque com o risco de perdermos os esforços que nos trouxeram até aqui. O resultado da eleição para presidente da República, em 30 outubro de 2022, fará diferença para o futuro de insegurança proposto pelo avanço da extrema direita representada pelo atual governo. Sabemos que não só no Brasil, mas no mundo, as forças do fascismo pairam sobre a liberdade dos povos. Racismo, misoginia, antiambientalismo, homofobia, ataques às religiões de matriz africana são exemplos de comportamentos criminosos ou antidemocráticos que poderão se acirrar e impedir o desenvolvimento desta nação ainda promissora, mas na iminência de perder sua liberdade.

Ameaças à democracia se juntam às piores práticas de exploração do meio ambiente que agravam o desequilíbrio climático, somando forças com a extinção de órgão reguladores e enfraquecimento da legislação ambiental no Brasil. Apesar de décadas de avanço na conquista de uma legislação robusta de proteção do meio ambiente, biodiversidade, povos originários, o que vemos agora é o retrocesso provocado por aqueles que hoje, em nome de um movimento depredatório, procrastinam a ocupação e exploração de territórios ocupados por florestas, rios, indígenas, quilombolas e ribeirinhos.

O Brasil está em perigo. A Amazônia está ameaçada. O Pantanal está ameaçado. O Cerrado está ameaçado. A fauna está ameaçada. A mineração e o garimpo são monstros selvagens manipulados por mercados de commodities exploratórias que poluem, degradam e matam. O agronegócio predatório avança sobre territórios imemoriáveis. O fogo torna carvão a floresta. A miséria já consome milhões de brasileiros. Faltam remédios, falta comida, falta saúde, falta respeito ao povo brasileiro.

O Brasil está em frangalhos, em mãos suspeitas e gananciosas de políticos corruptos que desconsideram o direito fundamental dos brasileiros a um meio ambiente equilibrado. É momento de destruir as armadilhas que nos prepararam e para isso conclamamos todos os ambientalistas brasileiros ou não, para que no dia 30 de outubro de 2022 votem com a sabedoria do amor. Conscientes do esforço empreendido nas duras lutas ambientais travadas pela sociedade, com a Constituição de 1988, para a construção de um Brasil exemplo ambiental para o mundo. 

Clique no link para assinar o Manifesto: MANIFESTO PELO MEIO AMBIENTE E PELA DEMOCRACIA | SumOfUs Petitions

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!


Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!

Faça parte dessa história. Assine a Carta.

  CONFIRA LISTADE SIGNATÁRIOS

segunda-feira, 25 de julho de 2022

Empresa italiana compra ouro ilegal de Terra Indígena no Pará


 Empresa italiana paga R$ 2,1 bi por ouro ilegal extraído em TI do PA

"O ouro extraído ilegalmente nos garimpos da Terra Indígena Kayapó, no sul do Pará, foi comprado pela Chimet SPA Recuperadora e Beneficiadora de Metais, sigla em italiano para Química Metalúrgica Toscana, companhia que teve receita de cerca de R$ 18 bilhões em 2020. A CHM, responsável por “legalizar” o metal amarelo por meio de fraude antes de enviar ao exterior, recebeu da Chimet, entre setembro de 2015 e setembro de 2020, 317 milhões de euros (R$ 2,1 bilhões) com a venda de cerca de uma tonelada do metal."

A PF investiga refinaria italiana Chimet que compra ouro de empresa ilegal da Amazônia brasileira. Documentos mostram que a empresa fornece ouro para gigantes da tecnologia do mundo: Amazon, Apple, Microsoft e Google. Fonte: Notícias de Mineração Brasil - Pf Aponta Refinaria Italiana Como Compradora De Ouro Ilegal Do Brasil (noticiasdemineracao.com)

Para chegar ao nome da refinadora italiana, a Polícia Federal (PF) investigou uma complexa organização criminosa do garimpo ilegal, formada por dezenas de personagens que atuam no sul do Pará e que mantêm conexões com empresas sediadas em São Paulo, Goiás e Rio de Janeiro - que, por sua vez, usam esquema fraudulento para lavar e exportar o metal.

O esquema foi descoberto em outubro do ano passado com a Operação Terra Desolada, quando foram expedidos 12 mandados de prisão e 62 de busca e apreensão, além do bloqueio de R$ 469 milhões das contas dos investigados. Na quinta-feira (10), três meses depois da operação, todos os detidos foram soltos por meio de habeas corpus.

A Chimet, grupo especializado em refinar ouro para a confecção de joias, como alianças de casamento, e para a formação de barras de ouro que são guardadas em cofres de bancos suíços, ingleses ou americanos, nasceu nos anos 1970 de um braço da Unoaerre, outra líder do setor na Itália e empresa quase centenária, que se apresenta como a responsável por produzir 70% das alianças de casamento vendidas no país. As duas são controladas atualmente pela mesma família, a Squarcialupi, e estão sediadas em Arezzo, cidade que tem tradição milenar na produção de joias.

Descrita no seu próprio site como uma empresa "amiga do meio ambiente" e detentora de certificados de sustentabilidade "por sua atuação responsável", a Chimet afirmou que sempre compra o metal acompanhado de documentos que atestem sua origem legal.

"As compras em questão sempre estiveram acompanhadas de documentação que atesta a proveniência lícita do metal, como demonstrado também das faturas e das autorizações para a exportação do fornecedor, além dos documentos da aduana, sejam brasileiros ou italianos", disse em nota. Entretanto, a empresa reconheceu "o risco de que efeitos negativos possam ser associados ao comércio e exportação de minerais de áreas de alto risco".

Fiscalização

O Brasil, nesse caso, é "a área de alto risco" devido à facilidade de se fraudar a origem do ouro, bem como à fragilidade da fiscalização por parte da Associação Nacional de Mineração (ANM) e demais órgãos. As notas fiscais que declaram a origem do minério são em papel, preenchidas pelo vendedor, que facilmente pode mentir sobre o local de onde foi extraído o metal.

"Infelizmente, o ouro ilegal é uma realidade no mercado europeu. As empresas têm essa dupla face, compram ouro de procedência ilegal para atingirem certos padrões internacionais de quantidade de produção", afirma Nunzio Ragno, presidente da A.N.T.I.C.O., sigla da associação italiana para a proteção do setor do ouro.

O inquérito da PF aponta ainda que a Chimet adquire o produto da brasileira CHM, em uma relação de parceria "estabelecida há décadas" por intermédio do italiano Mauro Dogi e seu filho Giacomo, que moram no Brasil. Ambos são os sócios da CHM e figuram como investigados pelo comércio ilegal de minério.

Eles são descritos pelos investigadores como "os principais destinatários do ouro ilegal oriundo das terras indígenas da região". Mauro Dogi já foi funcionário da Chimet na sua fábrica em Arezzo. "Observa-se que o próprio nome da empresa CHM é a simplificação de Chimet", diz o inquérito da PF, revelado pelo jornal O Estado de S.Paulo.

A CHM, por sua vez, comprou o metal da Cooperouri (Cooperativa de Garimpeiros e Mineradores de Ourilândia e Região) que, segundo a PF, extrai o ouro do território indígena. Como prova, os policiais informam que a empresa fundada por Dogi fez 25 depósitos à cooperativa, no total de R$ 11,7 milhões, no período de um ano (entre 2019 e 2020).

Além de extrair o minério de área ilegal, segundo a PF, a Cooperouri também adquire o metal de garimpeiros e atravessadores clandestinos que atuam na mesma região - foram transferidos R$ 246 milhões a estes fornecedores entre setembro de 2015 e setembro de 2020.

A Chimet, por meio do advogado Roberto Alboni, afirmou que Mauro Dogi trabalhou como operário na sede italiana durante cinco anos, entre 1990 e 1995, dando a entender que não se trata de pessoa que mantenha relação com os altos escalões da empresa. A companhia ainda contestou a informação citada na investigação brasileira: disse que sua relação com a CHM do Brasil durou "de quatro a cinco anos", sendo interrompida em outubro passado após a notícia da operação realizada pela Polícia Federal (e não décadas, como afirma o inquérito).

Em nota, a CHM negou que tenha adquirido ouro de terras indígenas e disse que suas aquisições foram feitas "de cooperativas aptas a minerar em suas respectivas áreas, as quais sempre apresentaram a documentação legalmente exigida e necessária para exercer suas atividades." A empresa confirmou que o minério adquirido tem como destino grupos estrangeiros e afirmou que "todo o ouro comprado no mercado interno passa pelo crivo da Receita Federal e da Polícia Federal quando do processo de exportação". As atividades da empresa, segundo seus advogados, estão temporariamente suspensas.

A reportagem tentou contato com a diretoria da Cooperouri, mas o advogado responsável pela defesa da cooperativa e de um dos seus diretores, Douglas Alves de Morais, não respondeu às perguntas até a publicação deste texto.

Tanto a Chimet como a Unoaerre têm certificados de boas práticas de organizações como a Responsible Jewellery Council, com sede em Londres, que elaborou uma linha guia para o setor de modo a observar a legalidade do ouro e a preservação dos direitos humanos, inclusive durante a sua extração. Elas ainda estão sujeitas a um regulamento aprovado pelo Parlamento Europeu em 2017 que impõe a obrigatoriedade do controle das fontes dos metais preciosos originários de fora da União Europeia e comprados por alguma empresa sediada na Europa. As informações são do Repórter Brasil.


terça-feira, 19 de julho de 2022

Precisamos ir às ruas



Imagem: Brasil Escola 

Telma Monteiro

Bolsonaro acaba de escancarar para o mundo o golpe que pretende dar. Por muito menos que isso já fomos às ruas em protesto. Nós estamos nos equilibrando numa linha tênue sobre um precipício que pode não ter fim. Vivemos um momento perigoso de quase total submersão numa crise institucional. Muita gente ainda não percebeu que a linha que nos separa do autoritarismo está se rompendo.

Quem vai impedir Bolsonaro de concretizar seu projeto golpista? As vozes que se levantam nas redes sociais pretendem substituir os protestos que deveriam acontecer em todas as ruas do Brasil, todos os dias? Carregar cartazes e faixas contra esse golpe em andamento é nossa única saída. Muitos movimentos se perderam ou perderam sua força com protestos cibernéticos ou assinaturas online. As urnas vêm depois, para sacramentar nossa escolha do Brasil que queremos.

Chegou a hora de sair para gritar, carregar faixas, colorir as faces, sem, contudo, derrapar para o partidarismo. Somos todos brasileiros, esqueçamos por alguns meses nossa ideologia e procuremos a união em torno de um único objetivo que é desqualificar e impedir esse golpe.

É preciso tingir de arco-íris as ruas brasileiras. Que seja, também, de verde e amarelo que são as cores de todos os brasileiros e não podemos nos impedir de usá-las. A democracia não é cinza. A liberdade não é cinza. 

quinta-feira, 14 de julho de 2022

A volta de Lula ao Planalto e o futuro da região amazônica, por Rodolfo Salm

Texto maravilhoso escrito pelo meu amigo Rodolfo Salm para o Correio da Cidadania. Queria que ele soubesse que eu assino embaixo. Sim, vamos votar em Lula, acreditando que ele ainda vá fazer um "mea culpa" para todas as barbáries ambientais cometidas durante o seu governo e o de Dilma Rousseff. Não esqueçamos que foi Dilma quem editou o PL para reduzir o Parque Nacional do Jamanxim, e permitir a passagem da Ferrogrão. Concordo que Bolsonaro é bandido e tem como objetivo destruir a Amazônia e os povos indígenas, para dar lugar ao seu projeto de exploração. Rodolfo Salm, no entanto, com maestria, nos mostra que Lula pode reverter isso, e eu complemento que basta ele reeditar suas promessas da campanha de 2002, gravadas numa carta, onde prometia, entre outras coisas, não construir hidrelétricas na Amazônia. Obrigada, querido amigo Rodolfo Salm, você tirou um nó da minha garganta. Eis o texto: 

Foto: José Cruz/ Agência Brasil


oto: José Cruz/ Agência Brasil

Rodolfo Salm

14/07/2022

A verdade é que eu enjoei de escrever como o governo Bolsonaro é bandido, destruidor e tem feito de tudo para acabar com a floresta amazônica. Muita gente tem escrito sobre isso melhor do que eu e de forma mais detalhada. Posso até estar sendo precipitado, mas me arrisco a dizer que esse governo acabou, que a eleição de Lula é certa, que ele tomará posse e será o futuro presidente. Se eu errar alguma dessas previsões, me perdoem, mas é desse ponto que começo minha reflexão.

Quando Lula tomar posse, o país estará economicamente arruinado e o povo cheio de esperanças no presidente que uma vez (quase) acabou com a fome e o desemprego. Mas ele pouco poderá fazer no curto prazo. No entanto, a extrema direita não desaparecerá e fará de tudo para desestabilizar o novo governo. Isso posto, estará ele disposto a travar uma verdadeira guerra contra centenas de milhares de garimpeiros, grileiros e toda a elite econômica de uma área equivalente a mais da metade do território nacional?

Uma guerra necessária para pôr um freio na destruição acelerada da floresta que ora apavora o mundo, porque esse povo não vai aceitar recuar pacificamente. Acredito que nem Lula saberia responder a tal questão. E caso estivesse disposto a enfrentar essa gente, eu mesmo também acharia prudente não o dizer antes do tempo, para não pôr em risco a eleição que estou dando como certa.

Porém, algumas declarações recentes sobre a região amazônica me deixaram especialmente preocupado. Estão todas em uma entrevista que ele deu à rádio Band News de Manaus. Em 80% da entrevista, falou coisas certíssimas e que não vêm ao caso comentar agora porque já declarei meu voto nele no primeiro turno e estou escrevendo para outros que também certamente já tomaram a mesma opção.

Vamos aos problemas:

Lula defendeu a reabertura e pavimentação da BR-319, que ligaria Manaus a Porto Velho, em Rondônia. Empresários teriam dito que essa obra é fundamental para o desenvolvimento da Zona Franca. Disse que, se feita com todo cuidado, incluindo até pontos de travessia de animais, teria um impacto ecológico desprezível. Ecologistas têm pânico da ideia de pavimentação da estrada, pois ela corta uma das áreas mais preservadas da Amazônia, com florestas prístinas e povos isolados, e ao mesmo tempo próxima de uma potente frente de colonização, que se estende por toda a região sul da floresta.

Ao defender que a obra seria viável, se feita "com todo cuidado", Lula incorre no mesmo erro que cometeu lá atrás, em seu primeiro governo, quando avançou com a pavimentação da BR-163 enquanto criou inúmeras unidades de conservação no seu entorno, momentaneamente contendo os desmatamentos. O erro foi ignorar o fato de que os ventos políticos sempre mudam e a governança que uma hora é forte sempre pode ser enfraquecida. Não precisou nem o PT sair do governo e, sob Dilma, os desmatamentos se alastraram ao longo da BR-163.

Mais tarde, com Bolsonaro, a região se tornou o principal foco de desmatamento na Amazônia. O estado atual de calamidade, evidentemente, é responsabilidade do atual governo, mas precisamos admitir que também é, em boa parte, culpa de quem investiu na pavimentação daquela estrada em primeiro lugar. Se Lula, em seu provável próximo governo, persistir com a ideia de recuperar a BR-319, cedo ou tarde a mesma coisa acontecerá.

Resta perguntar àqueles empresários: se a estrada pavimentada é tão importante para a Zona Franca, como ela já chegou tão longe sem este acesso? Assim, em nome da preservação da floresta que está sendo devastada rapidamente neste momento, não poderia seguir sem o acesso ecologicamente perigoso?

Outro ponto extremamente problemático da entrevista foi sua defesa das hidrelétricas do Rio Madeira e de Belo Monte, no Rio Xingu. Só não arranquei os adesivos da campanha de Lula do carro porque são muitos e um amigo que entende das sutilezas da política me alertou de que Lula não poderia fazer diferente neste momento mesmo que estivesse arrependido ou não estivesse disposto a construir novas grandes hidrelétricas na Amazônia. “A campanha é hora de defender suas administrações anteriores e ponto final”.

Foi aí que Lula disse que os ambientalistas o criticavam por essas obras pois eram contra hidrelétricas de modo geral. Portanto, seriam contra todas as hidrelétricas em qualquer lugar e em qualquer situação, comparando a divergência àquela entre torcidas de times de futebol rivais. Nem preciso argumentar que cada obra deve ser avaliada em seu contexto específico. Lula gosta de contar uma história para ridicularizar as preocupações dos ambientalistas. Diz que na época da construção de Itaipu, os ecologistas alertavam que as barragens mudariam o eixo da Terra e o clima da região. O fato é que foram construídas tantas barragens em altas latitudes, especialmente no hemisfério norte, que mudamos levemente a distribuição de massa do planeta, acelerando em uma fração de segundo o movimento de rotação da Terra. Não que haja um problema em dias minusculamente mais curtos, mas o fato ilustra a magnitude das transformações que estamos produzindo. Lula entendeu tudo errado e segue repetindo a história como se os ecologistas fôssemos todos estúpidos.

Sobre o clima na região Sul, quem acompanha as secas recorrentes na região pode dizer com segurança que estavam errados ao dizer que Itaipu traria mudanças climáticas? A construção da hidrelétrica certamente foi a causadora de grandes desmatamentos no Paraná que foram, sim, responsáveis por mudanças climáticas. Itaipu certamente teve seu papel no desenvolvimento do país, e ainda tem. Mas podemos falar o mesmo das grandes hidrelétricas na Amazônia construídas sobre o seu governo? Ainda mais agora que novas tecnologias de geração de energia surgem e ficam mais baratas a cada dia?

Sobre a construção das hidrelétricas do Madeira, Lula disse que chamou o maior especialista em sedimentos do mundo, vindo da Índia, que lhe garantiu que as hidrelétricas poderiam ser feitas sem problema nenhum. Mas para quê chamar alguém da Índia se temos gente altamente qualificada nas nossas universidades? Muitas das quais ampliadas ou criadas pelo próprio Lula, preciso destacar. Talvez porque os nossos pesquisadores já condenavam a construção das hidrelétricas do Madeira àquela época.

Eu não sou especialista em sedimentos de rio, mas testemunhei como o lago de Belo Monte se tornou lamacento em pouquíssimo tempo, sendo que o Xingu é um rio de águas claras com pouco sedimento, o que faz com que o processo lá seja bem mais lento do que no Madeira.

 Imagine tal processo multiplicado várias vezes nos rios de água branca (que tem esse nome justamente pela abundância de sedimentos) ... A prova das consequências negativas dessa construção sobre a dinâmica de seguimentos do rio está nas enchentes observadas nos últimos anos na cidade de Porto Velho. O rio, cheio de sedimentos, não dá mais conta de sua vazão máxima e transborda abundantemente sobre a cidade ribeirinha.

A energia hidrelétrica pode parecer barata, mas quem paga o preço são as populações mais vulneráveis nas cidades diretamente atingidas pela construção das barragens.

Lula ainda diminuiu a preocupação com os grandes bagres que tiveram suas rotas migratórias interrompidas pela construção das barragens. Disse que os peixes poderiam ser criados em cativeiro pelos antigos pescadores, uma das grandes mentiras divulgadas por barrageiros. Para começar, ribeirinho não é criador de peixe. Depois, experimente criar uma pirarara ou um surubim em cativeiro. É a coisa mais difícil do mundo. Impossível em escala comercial. Então não vamos falar bobagem. Se Lula não está preocupado com os bagres, que pelo menos diga claramente.

O mais doído para mim foi acompanhar o trecho da entrevista em que o ex-presidente falou sobre Belo Monte, pois acompanhei de perto a luta contra a barragem e seu processo de construção. Vivo hoje as consequências nefastas da obra, pois moro literalmente na beira do lago de Belo Monte. Em primeiro lugar, Lula disse que conversou e fechou acordo com todos, com ribeirinhos, com o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) e “até com o bispo” antes de decidir dar início à obra de Belo Monte.

É verdade que conversou com muita gente, mas não fechou acordo com ninguém desses citados. Ouviu muitas críticas e no final decidiu que ia fazer a barragem e pronto. Lula conversou com o bispo Dom Erwin Kautler só para dizer que a hidrelétrica não nos seria “enfiada goela abaixo”, como nos relatou o bispo. Só para depois fazer exatamente isso. Quando mostramos essa declaração recente de Lula aos nossos companheiros de luta, os ribeirinhos se revoltaram: “Eu não fiz acordo nenhum com ele”. A mesma coisa disse o pessoal do MAB. Cá para nós, quando quer, Lula pode ser bastante mentiroso (não tanto quanto Bolsonaro, caso algum minion queira tirar essa frase de contexto). E vai ter que mudar isso aí se quiser reverter o estado de bandidagem em que se encontra a região amazônica hoje em dia.

Lula lembrou que Belo Monte foi construída com um lago a fio d'água, que a área alagada não é muito maior do que aquela já alagada anualmente pela cheia natural do rio. É verdade. Mas não disse que a interrupção do ciclo de subida e descida das águas teria efeitos profundos sobre a ecologia de mais de uma centena de quilômetros de rio. Para começar, aquelas árvores que passavam parte do ano debaixo da água e outra parte no seco, morreram, apodreceram e tornaram a qualidade da água péssima.

Já falei sobre o acúmulo de sedimentos que transformou o fundo do rio em um imenso lamaçal. A Volta Grande do Xingu hoje em dia sofre com a falta d'água, prejudicando a navegabilidade e os processos naturais necessários à sobrevivência dos peixes e tracajás. Isso para não falar dos impactos sociais, que foram terríveis, principalmente sobre os mais vulneráveis, como crianças entregues à prostituição, por exemplo. Hoje em dia Altamira tem uma das maiores taxas de criminalidade do país. A cidade foi invadida por gangues como o Comando Vermelho na época de Belo Monte, que seguem firmes por aqui. Altamira tem um dos maiores índices de suicídio de jovens do país. Lula disse na entrevista que não sabe de nada disso porque desde que deixou a presidência parou de acompanhar o caso. Mas os problemas de Altamira volta e meia aparecem nos principais jornais impressos e na televisão. Se Lula parou de acompanhar notícias desde que deixou o Planalto, como pode se habilitar como candidato à presidência? Claro que não é verdade. Soltou mais essa para não precisar falar dos problemas que sabe ter criado.

Altamira era uma cidade feliz diante de um rio vivo e limpo. Hoje, a cidade é triste, morta e sem perspectiva. O mais irônico é que aqueles que criticavam a barragem na época de sua construção são os mesmos que estão defendendo a eleição de Lula nesse momento. Todos os que defendiam e foram beneficiados por Belo Monte, estão com Bolsonaro. Lula sempre foi um desenvolvimentista, enquanto Bolsonaro é um bandido da pior espécie. Por isso estamos com o primeiro. Agora, será ele capaz de controlar a bandidagem alucinada que tomou conta da Amazônia? Ele vai fazer a reforma agrária de que tanto precisamos? Ou vai permitir a construção do Ferrogrão, cujas terríveis consequências já foram bem descritas por Telma Monteiro? Vai acabar com os garimpos, zerar os desmatamentos e pôr um controle rígido sobre a mineração? Ou vai se unir novamente às elites locais, nos deixando mais uma vez uma ou outra sobra?

Seria muito fácil para ele ser muito melhor que o governo atual “em comparação” sem, no entanto, fazer as mudanças profundas necessárias a uma verdadeira transformação. Ele vai se conformar com essa opção politicamente mais simples? Difícil responder. Só o tempo dirá. Até o dia da posse seguirei torcendo para que dê tudo certo. Depois, colocando pressão para que ele, em sua última chance na vida, cumpra o seu destino de nos ajudar a realmente mudar esse país para melhor. Se quiser, de fato, fazer isso, terá de desafiar grandes forças econômicas e terá de travar uma verdadeira guerra na Amazônia. As elites locais serão, sem dúvida, uma força potente pela devastação, mas a comunidade internacional também pode se unir a ele em uma espiral ecológica virtuosa. Espero que tenha vontade e coragem para tal.

Rodolfo Salm é PhD em Ciências Ambientais pela Universidade de East Anglia, formou-se em Biologia pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. Atualmente é professor da Universidade Federal do Pará.

sexta-feira, 8 de julho de 2022

Ferrogrão - menos atrativa para os investidores

 

Imagem EIA da Ferrogrão - Parque Nacional do Jamanxim

Telma Monteiro

A Ferrogrão está cada vez menos atrativa para os investidores. O Supremo Tribunal Federal (STF) retirou de pauta – sine die - o julgamento da ADIN sobre a Ferrogrão ou EF-170 que teria acontecido no dia 15 de junho (2022). Só para atualizar, em março de 2021, provocado por um pedido do PSOL ao STF, o projeto foi paralisado por uma liminar concedida pelo Ministro Alexandre de Moraes. Afinal, uma ferrovia de 933 km para atravessar no sentido Norte-Sul o Parque Nacional do Jamanxim, uma Unidade de Conservação Federal de restrição total, não é algo que passe desapercebido pela comunidade internacional de olho no desmatamento da Amazônia.

Além desse desgaste, existe nos bastidores a preocupação com os custos da ferrovia, que já estão estimados em mais de R$ 20 bilhões, com viés de alta. Explicações? Sim, muitas. Entre elas a extensão da Ferrogrão que, de tão longa e sem terminais ao longo do traçado, poderia levar alguns anos para ser concluída sem que se tenha uma real noção dos custos. Mais um problema é o projeto mal pensado, segundo analistas do setor. Sem previsão atualizada de custos, considerando, inclusive, as questões ambientais e os impactos negativos sobre a floresta e as terras indígenas. 

Mas, mesmo com as investidas do governo federal para agilizar a decisão no STF, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, resolveu deixar o julgamento para depois das eleições de 2022. O movimento da bancada ruralista do Congresso Nacional não foi suficiente para pressionar o STF. Na minha análise, qualquer que fosse o resultado do julgamento, ele seria usado na campanha da reeleição de Bolsonaro. Se a Ferrogrão fosse liberada pelo STF, seria uma vitória para o governo e o agronegócio. Mas se ao contrário, o plenário mantivesse a decisão de que alterar os limites do PARNA Jamanxim é inconstitucional, Bolsonaro jogaria para a plateia a “perseguição” ao seu governo. A atitude do STF de não julgar agora a questão foi acertada.

O governo brasileiro não se preocupou com a importância da biodiversidade no traçado da Ferrogrão, no Corredor de Sociobiodiversidade do Xingu (CSX), na Amazônia oriental, desconsiderando os impactos ambientais e sociais. A prova disso é a aprovação do traçado que corta o PARNA Jamanxim. A sucessão de erros iniciada no governo de Dilma Rousseff, com a edição da MP758/2016 que virou a lei inconstitucional 13.452/2017 para desafetar o Parque Nacional do Jamanxim, acabou por violar os artigos 216, 225, §1º, inciso III e 231 da Constituição Federal. Motivos mais que suficientes para que Alexandre de Moraes concedesse a liminar que paralisou o projeto, em março de 2021.

Interessados na Ferrogrão

Apesar do empenho do governo federal e do ex-ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, no Roadshow de ofertas de projetos de infraestrutura, que percorreu de Nova Iorque à Dubai, passando por Espanha e França, não houve nenhum interessado na Ferrogrão, oficialmente. O Fundo Mubadala, se mostrou fracamente interessado na Ferrogrão e acenou positivamente ao então ministro. O Mubadala é um Fundo Soberano, investidor com grande variedade de ativos, em setores diversos e muitas regiões do mundo, que tem em sua carteira desde petróleo, gás, infraestrutura, com o único fim de beneficiar os Emirados Árabes Unidos. O Fundo chegou a adquirir, recentemente, uma refinaria da Petrobras na Bahia.

Ainda sobre o Mubadala, é importante ressaltar que ele pretende disputar os leilões de concessão rodoviária no Brasil. O Metrô do Rio de Janeiro (Metrô Rio e empresa Metrô Barra) já é empresa subsidiária desse Fundo que foi criado em 2008, com sede em Abu Dhabi. O Mubadala tem investimentos em defesa, energia e mineração em mais de 50 países. No Brasil o fundo está de olho em portos, estradas, óleo e gás, logística e participou de licitação para aquisição de uma rede de gasodutos no Nordeste. O Mubadala é um negócio de US$ 243 bilhões distribuídos em seis continentes e está mirando seriamente o Brasil.   

Em tempo, vale mencionar que o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, esteve reunido na sede do fundo Mubadala, em Abu Dhabi, em fevereiro deste ano (2022), com o fim de atrair recursos para projetos que envolvem etanol, fertilizantes, mercado de carbono e infraestrutura. De olho na Ferrogrão, o Mubadala, não se comprometeu ainda, talvez aguardando a decisão do STF sobre a ação de inconstitucionalidade.

Outro grupo que se mostrou interessado na Ferrogrão é a Citic, empresa de investimentos que pertence ao governo chinês, considerado um fundo-Estado com uma carteira de US$ 1,4 trilhão. Há entendimento no governo de que aos chineses interessaria muito a ferrovia, levando-se em conta a necessidade de escoamento de grãos.

Aproveitando a oportunidade, é importante mencionar nesse contexto a atuação da empresa Hidrovias do Brasil envolvida em aquisições e parcerias no setor de transporte hidroviário. De olho no fluxo de grãos para o Arco Norte, se a Ferrogrão sair do papel, o governo brasileiro pode tirar da gaveta o Complexo Tapajós, com as hidrelétricas e eclusas. Hidrovias do Brasil, adquirida pelo Pátria Investimentos tem na mira a Integração Logística (AL).

Conclusão

A Ferrogrão começa com um projeto falho e acaba com o não cumprimento da legislação socioambiental, aí incluídos os impactos negativos sobre as terras indígenas e o aumento do desmatamento. Apesar da alteração da licitação para concessão simplificada e a ausência de interesse demonstrado por grandes investidores e empresas nacionais e internacionais, um fato chama nossa atenção: a habilitação oficial de uma pequena empresa nacional, sem histórico comprovado de obras de grande porte, com um capital social incompatível com as dimensões e abrangência da obra. Como uma empresa local sediada na cidade de Sorriso, MT, pequena construtora de casas populares, pode sustentar financeiramente tal empreitada?

Uma teoria, no entanto, não pode ser descartada. A Ferrogrão, projetada para ter 933 km para ligar Sinop (MT) à Miritituba (PA), como já mencionado acima, levaria alguns anos para ser concluída, portanto sem que o aporte de investimentos necessário seja dimensionado com precisão. A Zion Real Estate Ltda. ME, a empresa habilitada (segundo a publicação DO da União, em 24 de janeiro de 2022, com assinatura de Marcelo Sampaio Cunha Filho, atual ministro da Infraestrutura) pelo Ministério da Infraestrutura, ainda sob a administração do ex-ministro Tarcísio Gomes de Freitas (atual candidato ao governo do estado de São Paulo). O ponto que mais chama a atenção nessa habilitação/autorização é que ela foi concedida fora do padrão proposto inicialmente, ou seja, um projeto único sem intersecções. Na publicação do Diário Oficial da União, no entanto, consta que a Ferrogrão foi desmembrada em três etapas ou trechos, e considerada como três estradas de ferro:

1. “autorização para construção e exploração de Estrada de Ferro entre os municípios de Sinop/MT e o município de Moraes Almeida/PA, pelo prazo de 99 anos”;

2. “autorização para construção e exploração de Estrada de Ferro entre os municípios de Moraes Almeida/PA e o município de Novo Paraná (PA), pelo prazo de 99 anos”;

3. “autorização para construção e exploração de Estrada de Ferro entre os municípios de Novo Paraná (PA) e o município de Miritituba (PA), pelo prazo de 99 anos”.

Facsimile da publicação no DO da União

Essa partição da Ferrogrão, pode explicar alguns pontos:

1.     A Zion pode ser apenas uma “cobertura” para espera de alguma outra ou algumas outras empresas brasileiras/investidores internacionais;

2.     A partição em três trechos facilitaria que armazéns, pátios, centrais intermodais fossem construídos, possibilitando que além de grãos, pudesse ser transportado minério para o Arco Norte;

3.     Poderia, também, haver três empresas diferentes interessadas, uma para cada trecho;

4.     Análises dão conta que sendo as safras de grãos sazonais, poderia acarretar períodos em que a Ferrogrão teria alto índice de ociosidade e um custo operacional maior, não absorvível pela concessionária;

5.     Outro ponto importante é que, com três trechos, haveria impactos não dimensionados com uma ocupação desordenada maior e a construção de mais rodovias/ferrovias, aumentando o desmatamento em direção ao Xingu (para leste) e em direção aos Munduruku (oeste);

6.     Com o crescimento das áreas de ocupação, desmatamento e avanço do agronegócio, mais impactos atingiriam as terras indígenas, além da expansão do garimpo e mineração. 

sexta-feira, 17 de junho de 2022

Vale do Javari: lavra garimpeira de ouro ilegal

Pesquisa de Telma Monteiro



Rio Quixito e rio Itaquí, com 9 mil ha, no Vale do Javari, de Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), de ouro, concedida pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Essa permissão foi dada na região de faixa de fronteira e Terra Indígena (em rosa no mapa). À direita no mapa pode-se ver processo minerário de Nióbio em sobreposição à Terra Indígena. 

 

Processo da COOGAM na Agência Nacional de Mineração (ANM), para o Vale do Javari

Em lilás a Permissão de Lavra Garimpeira em Atalaia do Norte, Vale do Javari

quarta-feira, 15 de junho de 2022

STF tira de pauta o julgamento da Ferrogrão


Traçado na Ferrogrão que atravessa o Parque Nacional do Jamanxim,
Unidade de Conservação Federal de restrição total

 #Ferrogrão: o projeto que seria julgado hoje (15) no #STF foi retirado de pauta. Ótimo, pois há sérios indícios de irregularidades no processo de licenciamento. A #Amazônia tem sido palco de violações dos direitos dos povos indígenas. #DomPhillips e #Bruno pic.twitter.com/lNSoq1Rg8r

quinta-feira, 19 de maio de 2022

Ferrogrão: anatomia de uma megaobra sem grandes interessados


 

Dephositphotos

Reprodução Correio da Cidadania

A síntese é um quadro onde o ordenamento jurídico de proteção ao meio ambiente e aos povos da terra é desmantelado pelo próprio governo, ao passo que os entraves burocráticos e as empresas nacionais mais capacitadas para grandes obras praticamente desapareceram na esteira da Lava Jato. Ficou muito mais fácil realizar obras ferroviárias, pois o novo regime de autorização aprovado no final de 2021 pelo Congresso Nacional permite que qualquer empresa se habilite. Não há mais a chamada licitação.

 Gabriel Brito, da Redação

 Era 15 de agosto de 2012 quando o governo federal de Dilma Rousseff lançou Plano de Investimentos em Logística (PIL), a mais ambiciosa iniciativa do governo federal para ativar o setor produtivo nacional e sustentar um ‘milagre econômico petista’ que já se mostrava declinante. O pacote visava promover concessões e outorgas em portos, aeroportos, rodovias, hidrovias e ferrovias, e movimentaria por volta de 450 bilhões de reais em investimentos.

 Era o tempo da euforia dos mercados com o modelo econômico brasileiro, em vias de ser coroado pelos megaeventos esportivos, e empresas como Odebrecht, OAS e Camargo Correa pontificavam no setor produtivo privado nacional. Dilma acabara o que na época ficou conhecida como “a faxina anticorrupção”, principal marca de seu primeiro ano de governo, quando demitiu seis ministros no primeiro semestre de seu mandato por acusações de corrupção.

 O PIL fora concebido também como política de contenção às altas taxas de juros em voga. No entanto, com uma taxa de retorno dos projetos que não foi além de 7%, os grandes “investidores” não puderam sair de suas cômodas aplicações em títulos financeiros, em especial do Tesouro, que pagavam juros de dois dígitos sem qualquer risco ou exigência de gasto produtivo real.

 O pacote de investimentos não decolou e, para muitos, as iniciativas da então presidente em moralizar seu gabinete de governo começaram a custar a lealdade do aliado PMDB e do sempre governista ‘centrão’. Seu mandato terminou em estagnação econômica e uma vitória eleitoral apertada que prenunciava uma dificílima governabilidade para o segundo mandato.

 No meio do ambicioso pacote descansava o projeto de construção da EF-170, mais conhecida como Ferrogrão, uma portentosa estrada de ferro de mais de 900km de extensão que ligaria o polo agroextrativista de Sinop-MT ao porto de Miritituba, norte do Pará, escoadouro da produção agromineral brasileira.

Já no governo Temer, o consórcio EDLP – Estação da Luz Participações Ltda. – foi escolhido para realizar os estudos da Ferrogrão ou EF-170. O grupo envolvia as tradings Amaggi, ADM, Bunge, Cargill, Dreyfus e EDLP, que custearam os estudos técnicos e de diagnóstico ambiental da ferrovia para a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT).

 “Em 2014, o Ministério da Infraestrutura publicou um edital para a elaboração dos Estudos de Viabilidade da ferrovia, e a Estação da Luz Participações – EDLP - se propôs a fazer o relatório de viabilidade técnica, entregue em 2016. Inicialmente, a Ferrogrão seria licitada por um período de 69 anos. No governo de Jair Bolsonaro a regra está mudando para um regime de concessão em que os investidores ou empresas poderão obter uma Autorização Simplificada, conforme a Medida Provisória – MP 1065/21, um novo marco legal do transporte ferroviário que dá permissão para construção de novas ferrovias por meio desta autorização simplificada, sem necessidade de licitação. O custo atualizado da construção da Ferrogrão já está perto dos R$ 20 bilhões. A ideia do governo federal é um retrocesso histórico comparável com a época da ditadura militar, que tinha o objetivo de ‘ocupar’ o vazio demográfico na Amazônia”, escrevera a ambientalista e pedagoga Telma Monteiro, em trabalho pioneiro sobre o tema a respeito deste projeto.

 Em busca de investidores

 Se antes vivia-se uma euforia econômica quase sem precedentes, a ponto de um projeto de tal envergadura obter pouco destaque nos debates de então, hoje observa-se um país devastado por uma pandemia e uma crise econômica sem data pra acabar, com alta descontrolada de preços, desemprego e corrosão da renda média dos trabalhadores. Membro de um governo que não tocou nenhuma obra relevante, o então ministro da Infraestrutura Tarcisio Gomes fez um “Roadshow” por países líderes do capitalismo global em outubro de 2021, a fim de obter financiamento privado para a EF-170. Afinal, a febre brasileira do “combate à corrupção” veio acompanhada de uma política macroeconômica de uma nota só, onde reina inconteste a austeridade total nos orçamentos públicos sociais e o BNDES foi extinto de seu papel de indutor do crescimento econômico. Mas, como se vê nas iniciativas governamentais de repaginar o Bolsa Família e tentar restringir os impactos da inflação em alimentos, combustíveis e energia, a fé no setor privado como organizador da retomada dos investimentos e da atividade econômica produtiva parece arrefecer.

 E, apesar do interesse formal manifestado por grandes holdings do setor agromineral, nacional e internacional, o ministro voltou de mãos abanando. O violento processo de desmonte das legislações e órgãos de controle ambiental, associado ao brutal mandato do ministro Ricardo Salles no Ministério do Meio Ambiente, amplamente condenados pela opinião pública e governos dos países líderes da economia global, parece ter gerado o chamado ambiente de insegurança jurídica.

 Além disso, ao longo dos primeiros três anos de governo Bolsonaro, o país foi pautado por episódios marcantes, como o Dia do Fogo, os incêndios do Pantanal, frequentes cercos e invasões a territórios indígenas em função dos recursos minerais do subsolo e a já tradicional violência no campo em razão de conflitos pela terra.

 Se de um lado houve enfraquecimento em órgãos como Ibama, Funai e ICMBio, ao se ver constrangido pelas críticas o presidente da República criou o Conselho Nacional da Amazônia, via decreto publicado no Diário Oficial em 12 de fevereiro de 2020. Como de hábito de sua administração, o órgão não se caracteriza por prestigiar funcionários técnicos de carreira e sua chefia foi dada ao general e vice-presidente Hamilton Mourão. Para além de declarações protocolares de respeito às normas ambientais e metas de redução de desmatamento, não há qualquer ação de destaque do órgão no controle do assédio à floresta.

 Aliás, sobre a crescente violência contra povos indígenas, a exemplo do ataque aos yanomâmi que terminou em brutalidade contra crianças, nem sequer declarações protocolares foram dadas.

 Mais recentemente o Acampamento Terra Livre, organizado pelos povos indígenas em oposição à tese do Marco Temporal da Terra, defendida pela ampla bancada ruralista e o próprio gabinete de governo, e a divulgação dos altos índices de desmatamento no mês de abril completam o corolário de fatos geradores de desconfiança para grandes negócios na atual conjuntura brasileira.

 Mesmo assim, se consideramos as declarações de alguns dos generais brasileiros, além do próprio presidente da República, a respeito do que seria uma gestão adequada da Amazônia, inclusive com apoio a projetos de garimpo e mineração, parece difícil não concluir que o Estado brasileiro se porta como ativo mobilizador do avanço do capital privado sobre a floresta.

 Resta saber quais capitais privados toparão a empreitada, uma vez que até o agronegócio interessado mais propriamente no corredor de escoamento de seus grãos reconhece o avanço de práticas predatórias contra os territórios que margeiam o traçado da Ferrogrão.

 á as grandes empresas internacionais que testemunharam o Roadshow do ministro, têm demonstrado preocupação com projetos de exploração agromineral sem sustentabilidade comprovada, em especial quando não contam com aprovação dos povos que habitam os territórios cobiçados. Por fim, a participação brasileira na COP-26 e o isolamento político internacional em que o país se submergiu parecem afastar de vez as empresas da “primeira linha” do capitalismo global.

 Parque Nacional do Jamanxim

Ponto importantíssimo da obra é que ela acompanharia trecho da BR-163, que já corta ao meio o Parque Nacional do Jamanxim, além de cruzar uma miríade de terras indígenas, habitadas por diversas etnias. Em 2016, Dilma editou MP que desafetava o trecho do Jamanxim que seria afetado pela construção da Ferrogrão, decisão que deve ir a julgamento pelo STF em junho após contestação com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) por parte do PSOL.

Localização do Parque Nacional Jamanxin (PARNA) | Mapa: reprodução Telma Monteiro.

“O Parque Nacional do Jamanxim, unidade de conservação criada em 2006, já sofre os impactos da BR-163 no sentido norte-sul. A importância dessa Unidade de Conservação (UC) é tanta que é considerada uma ‘unidade-corredor’, pois liga o mosaico do Tapajós ao mosaico do Xingu. São mais de 17 milhões de hectares de áreas protegidas federais. O asfaltamento da BR-163 já está concluído e com ele o aumento do tráfego; segundo os estudos técnicos da Ferrogrão: ‘incrementou os acidentes envolvendo a fauna silvestre, as ocorrências de incêndios e a vulnerabilidade a desastres com cargas contaminantes’”, anotara Telma Monteiro em 2021.

 Com as travas jurídicas interpostas pelo MP, a desconfiança dos grandes investidores e a aproximação das eleições presidenciais, o projeto parece esbarrar em numerosos obstáculos para sair do papel. Até porque não está claro de onde viriam os recursos. No entanto, a pesquisadora e colunista deste Correio é enfática na compreensão dos interesses em jogo.

 “Os 933 km da Ferrogrão podem sair do papel a qualquer momento. O novo marco legal ferroviário foi implantado pelo governo Bolsonaro como forma de agilizar o processo. Agora a empresa, investidores escolhem como, quando e onde e apresentam o projeto da ferrovia que será autorizada como concessão. Como já acontece com os portos e aeroportos no Brasil: concessão, outorga por autorização para construir e operar ferrovias, ramais, pátios e terminais ferroviários. A Medida Provisória nº 1.065/21, escancara a liberdade de empresas transportadoras, operadores logísticos e indústrias de requisitar autorização ferroviária para construir e operar. O estudo técnico conterá a escolha do traçado, a localização e necessárias obras complementares. A responsabilidade de fiscalizar e fazer cumprir a legislação ambiental, nesse caso, pode sair das mãos do governo e passar para a iniciativa privada”.

 Há quem queira

 Atualmente, apenas uma desconhecida empresa se candidatou a receber verbas e tocar o projeto. Trata-se da Zion Real Estate, até aqui ignorada pelo público e a imprensa de massa.

 A primeira empresa e única (até o momento da postagem deste artigo) a formalizar o pedido para construir a Ferrogrão chama-se Zion Real Estate Ltda. Uma pesquisa sobre a empresa nos leva a uma pequena construtora com características fora do escopo que se espera para a construção de ferrovias e sem qualquer histórico de obras públicas. A Zion Real Estate Ltda tem duas sedes e dois CNPJs: 27.691.878/0001-77, uma sede está na cidade de Sorriso, MT, com 4 anos e 10 meses de existência, fundada em 09/05/2017; outra com o CNPJ 27.691.878/0002-58, foi fundada em 20/09/2021, com sede na Rua F-1 83 Sala 01, Praeirinho, Cuiabá, MT. A principal atividade econômica, conforme consta na Receita Federal, é a construção de moradias, não há menção sobre expertise em construção de ferrovias.

 A Zion teve origem no Paraná com duas irmãs, Gabrieli Mosena e Daniela Mosena Librelato (*2), uma arquiteta e outra engenheira civil. Daniela carrega o sobrenome Librelato, nome da empresa que é uma das maiores fabricantes de implementos rodoviários do país. Para se ter uma ideia do porte da Librelato, ela acabou de fechar acordo para fornecimento de 300 Rodotrens Basculantes Premium à AMAGGI, empresa do setor do agronegócio, e também voltada para Commodities, Logística e Operações e Energia do Brasil. A Librelato tem sede em Cuiabá, MT, e o setor do agronegócio é seu maior cliente”.

 O bairro em que se localiza a sede da Zion foi historicamente ocupado por pessoas pobres e fica na periferia da cidade, longe de qualquer eixo comercial mais tradicional.

No dia 24 de janeiro, o Diário Oficial da União publicou o Aviso de Autorização, firmado pelo Ministério da Infraestrutura, que acolheu oficialmente o pleito da Zion em obter o direito de construir Ferrogrão, em seus três trechos. O ofício está assinado pelo atual ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio Cunha Filho.


 Em visita ao inacabado site da empresa, há um logotipo da construtora BS na lista de parceiros. A BS está em recuperação judicial desde 2011. Tem dois CNPJs, ambos inaptos na Receita neste momento (confira aqui e aqui) e capital social declarado de R$ 500.000. O quadro de sócios e administradores conta com três nomes em ambos os registros: Aglaucio Viana de Souza – Diretor, e o casal Eliane Pereira Borges dos Santos – Diretora, e Sidnei Borges dos Santos – Presidente.

 

Empresa postou o outdoor em suas redes sociais. Reprodução.

 A empresa é publicamente entusiasta do presidente Jair Bolsonaro e fez até outdoors de apoio à sua campanha presidencial em 2018. Mais que isso, Eliane foi candidata à deputada federal pelo PSC no Mato Grosso, em pleito no qual não conseguiu se eleger após obter 18.313 votos. Em sua ficha no TSE, declarou patrimônio de R$ 1,2 milhão. As irmãs Gabrieli e Daniela, da Zion, por sua vez, são suas sobrinhas. Apesar do banner no site da Zion, oficialmente, Zion e BS não se declaram parceiras.

Lista de parceiros da Zion publicada no site da empresa | Reprodução

Em meados de 2012, o passivo oficial da empresa era de 95 milhões. Destaque até na mídia corporativa, a BS vivera um boom entre 2008 e 2010, chegando a faturar até 180 milhões em obras residenciais, com especialidade em conjuntos pré-construídos.

 De acordo com Eduardo Henrique Viera Barros, da ERS Advocacia, que prestou serviços à BS em sua recuperação judicial, “a construtora enfrentou problemas no cumprimento de seu principal projeto, a construção do Polo Industrial de Jirau, tendo que tomar empréstimos em instituições financeiras para conseguir capital de giro. Além disso, alguns empreendimentos da incorporação imobiliária no Norte do país se tornaram inviáveis, causando graves prejuízos, principalmente por conta da crise do ano de 2008, que arrasou a economia em todos os setores do mundo”.

Conforme nota pública da própria ERS: “Eduardo Henrique explicou que em 2010, com a necessidade de captação de recursos para finalização de obras, pagamentos de folha de salário, a construtora contratou com uma instituição financeira uma operação de R$ 50 milhões. A partir daí a BS entrou num círculo vicioso de empréstimos aos bancos privados, que sabido por todos praticam uma das maiores taxas de juros do cenário mundial, para cobrir outros financiamentos e usando todos os recursos que entravam somente para amenizar juros e renovar financiamentos”.

 Em 2011, por conta no atraso da entrega dos conjuntos residenciais de Porto Velho, contratados para mitigar a remoção compulsória dos afetados pela construção da hidrelétrica de Jirau, que arrastou um enorme contingente de trabalhadores para as obras e acumulou problemas de caráter social, o MP-RO entrou com pedido de quebra de sigilo fiscal da empresa. A partir de então, as coisas não voltaram a decolar para a empresa do casal Borges.

 Em 2021, os processos judiciais ainda seguiam e os donos da empresa conseguiram decisão judicial favorável ao desbloqueio de bens.

 Situação atual

 A síntese é um quadro onde o ordenamento jurídico de proteção ao meio ambiente e aos povos da terra é desmantelado pelo próprio governo, ao passo que os entraves burocráticos e as empresas nacionais mais capacitadas para grandes obras praticamente desapareceram na esteira da Lava Jato, sob as punições e acordos que os promotores da operação capitaneada pelo ex-juiz Sergio Moro fizeram com os executivos das outrora “campeãs nacionais”.   

 Ficou muito mais fácil realizar obras ferroviárias, pois o novo regime de autorização aprovado no final de 2021 pelo Congresso Nacional permite que qualquer empresa se habilite. Não há mais a chamada licitação. Com o novo modelo, empresas de qualquer porte ficam responsáveis pelo planejamento e construção, e têm toda a autonomia. Teoricamente o Estado vai apenas fiscalizar as normas de segurança após conceder a chamada Autorização de Construção.

 Segundo o Ministério da Infraestrutura, a Ferrogrão (EF-170) está recebendo proposta e projetos de empresas. O Programa de Autorizações Ferroviárias ou Pro Trilhos, segundo o MInfra, vai permitir que “o setor privado possa construir e operar ferrovias, ramais, pátios e terminais ferroviários”. Além da ferrovia para escoar os grãos do norte do Mato Grosso, está prevista a construção de 54 pátios de carga e descarga e a recuperação da BR-163. Mas até o momento apenas uma empresa se habilitou para o megaprojeto: a Zion Real Estate.

 No caso da Ferrogrão o governo federal também decidiu disponibilizar, para a empresa habilitada, R$ 2,2 bilhões para reduzir riscos. Em janeiro de 2021, o Tribunal de Contas da União (TCU) se manifestou contra essa decisão de destinar o recurso para a futura empresa que vai construir a ferrovia. Segundo o governo federal esse recurso seria para garantir “riscos não gerenciáveis” atribuídos ao poder público, sem especificar o que poderiam vir a ser tais “riscos não gerenciáveis”.

Ouça o podcast com a ambientalista Telma Monteiro sobre Ferrogrão:

 CorreioCast11: Ferrogrão (EF-170) e a exploração da Amazônia, com Telma Monteiro

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Gabriel Brito é jornalista e editor do Correio da Cidadania.

Colaboração de Telma Monteiro.

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