Livro reúne análises sobre projetos hidrelétricos na América Latina e a atuação do Ministério Público


Por Ministério Público Federal no Pará, Assessoria de Comunicação

A obra registra a importância de que os impactos causados pelas hidrelétricas sejam vistos e tratados de uma forma integrada

Os impactos causados pela instalação de hidrelétricas na América Latina e a maneira como o Ministério Público trabalha para evitá-los ou minimizá-los são tema de livro lançado no final de 2013 por membros do Ministério Público de vários países da região e pesquisadores. Além disso, “Hidrelétricas e atuação do Ministério Público na América Latina” apresenta propostas para que poder público, empresas e cidadãos possam aprofundar a análise e o tratamento das questões socioambientais ligadas a esses impactos, principalmente na região amazônica do Brasil, Equador e Peru


Disponível na internet (http://bit.ly/hidreletricasMP), a obra foi lançada no 5º Congresso Latino-americano de Promotores de Justiça e Ministérios Públicos Ambientais, realizado em Bogotá, na Colômbia, pela Rede Latino-Americana do Ministério Público Ambiental. Os textos são fruto de encontros da rede realizados encontros em Brasília, Quito e Belo Horizonte, e têm a participação de membros da rede e de colaboradores externos. 


A obra destaca a imprescindibilidade da atuação do Ministério Público no controle dos licenciamentos ambientais de empreendimentos hidrelétricos, especialmente para viabilizar a responsabilização dos infratores das normas ambientais, agentes públicos ou privados, assegurar a defesa da ordem jurídica, a proteção ao meio ambiente, a atuação preventiva, a completa avaliação dos impactos ambientais e a participação social, nos termos da lei de cada país.


Organizada pelo promotor de Justiça em Minas Gerais Leonardo Castro Maia, pela procuradora de Justiça no Rio Grande do Sul Sílvia Capelli e pelo procurador da Republica no Pará Felício Pontes Jr., a obra registra a importância de que os impactos causados pelas hidrelétricas sejam vistos e tratados de uma forma mais integrada, observando-se os efeitos acumulados da instalação de diversas hidrelétricas em uma mesma região.


“Muitos desses empreendimentos são financiados por bancos supranacionais e os efeitos ambientais estendem-se por bacias hidrográficas que não conhecem fronteiras, a atuação harmoniosa do Ministério Público em rede mostra-se fundamental para enfrentar tais problemas e proteger o meio ambiente e as populações afetadas”, diz a organizadora do livro Sílvia Capelli, coordenadora executiva da Rede Latino-Americana do Ministério Público Ambiental. 


Manifesto pela transparência – Nos dez artigos da obra, temas recorrentes são as menções aos impactos socioambientais das obras e como a falta de atendimento à legislação ambiental contribuiu e contribui para agravá-los. Entre as irregularidades mais citadas estão a falta de diálogo e transparência por parte do poder público e de empresas responsáveis pela construção das obras.


Em seu artigo, a advogada equatoriana e mestre me direito ambiental internacional Alicia Cristina Muñoz Torres aponta que a situação piora porque a maioria dos operadores do direito desconhece a legislação ambiental. “Como os danos à natureza são irreversíveis, deveria existir órgãos de prevenção de danos ambientais, e não esperar-se até que os fatos ocorram para que as medidas comecem a ser adotadas”. 


As integrantes da Associação Interamericana para a Defesa do Ambiente (Aida) Astrid Puentes Riaño, Ana María Mondragón Duque e María José Veramendi Villa fizeram uma apresentação e sistematização de instrumentos e normas internacionais e decisões aplicáveis em casos de grandes barragens. As pesquisadoras consideram crucial que os membros do Ministério Público conheçam e atuem para garantir que essas normas sejam aplicadas. Segundo elas, os projetos hidrelétricos vêm desrespeitando essa legislação, em especial a obrigação de realização de consulta prévia, livre e informada. 


Para o procurador da República João Akira Omoto, o conflito entre normas no âmbito do direito ao desenvolvimento sustentável é um problema de difícil equacionamento, tendo em vista o ambicioso objetivo por ele proposto: a compatibilização entre interesses e direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, ancorando-se no tripé crescimento econômico, equidade social e preservação ambiental. 


Já na visão do procurador da República Felício Pontes Jr. e do pesquisador Rodrigo Oliveira, o item “crescimento econômico” tem que relativizado, porque não há um só modelo de desenvolvimento. Segundo eles, hoje a Amazônia é testemunha – e vítima – de um confronto entre o modelo predatório e o modelo sustentável. O predatório é pensado para a maximização da exploração econômica agro-minero-exportadora em detrimento das condições socioambientais e culturais, e nele a vida das pessoas pouco significa. De outro lado, o modelo de caráter sustentável e participativo compreende a situação geopolítica da Amazônia como fronteira de inovações e tradições alternativas à expansão do modelo capitalista e se sustenta mediante o reconhecimento da livre-determinação dos povos indígenas e da sociedade local de controlar e decidir sobre as ações que afetem diretamente suas vidas e sociedades. 


Efeitos cumulativos - O promotor de Justiça em Minas Gerais Leonardo Castro Maia faz um balanço das principais questões relacionadas aos projetos hidrelétricos e à atuação do Ministério Público em relação ao tema, registrando que a instituição vem buscando, continuamente, exigir a completa avaliação dos impactos ambientais, inclusive considerando o conjunto de empreendimentos da bacia hidrográfica e seus efeitos sinérgicos e cumulativos, sem prejuízo dos estudos de impacto ambiental, para as obras e atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente, ou de outros estudos ambientais.


Ente outros pontos, Maia também diz que o Ministério Público tem atuado para evitar a postergação de estudos de diagnóstico próprios da fase prévia para fases posteriores, sob a forma de condicionantes do licenciamento, agindo, se for o caso, pelo indeferimento do requerimento de licença, seja na seara administrativa, seja pela via judicial.


Para o advogado Leonardo Pereira Rezende, integrante da assessoria jurídica de populações atingidas por barragens, e para o engenheiro Antônio Fonseca dos Santos, conselheiro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico e do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, quem conhece os problemas, necessidades e oportunidades locais não é o empreendedor ou os seus consultores, mas, sim, quem mora e vive na região potencialmente atingida, sendo que essas oportunidades têm de ser definidas pelas pessoas do lugar de forma honesta, livre de quaisquer disputas políticas que possam ocorrer, pensando no bem comum e não no bem ou interesse particular.


A observância dos compromissos socioambientais na concessão de financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o tema do artigo do procurado da República Marco Antonio Delfino de Almeida. De acordo com o estudo apresentado por Almeida, o banco não tem mecanismos que permitam o controle social desses financiamentos. “O estabelecimento de salvaguardas detalhadas, transparentemente divulgadas e devidamente internalizadas no processo de concessão e, especialmente de monitoramento de financiamentos concedidos deve substituir a mera adesão a declarações genéricas, com amplo campo de interpretação”, critica o procurador da República.


O promotor de Justiça em Minas Gerais Paulo Cesar Vicente de Lima e o consultor legislativo de meio ambiente e desenvolvimento sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais Vitor Vieira Vasconcelos analisam experiências no Estado com os Planos de Assistência Social (PAS), relacionados às ações de reassentamento das populações atingidas pelo enchimento dos reservatórios. 
Com foco mais detalhado nas usinas hidrelétricas de Irapé e Candonga, os autores demonstram, em termos práticos, a indissociabilidade da análise social e ambiental na instalação de grandes reservatórios. Como exemplo, eles citam uma avaliação dos impactos sociais das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, em Rondônia, durante as obras de instalação desses empreendimentos.


De acordo com estudos, esses dois empreendimentos recrutaram cerca de 37 mil funcionários de outros Estados do Brasil. Porto Velho, de 2008 a 2010, teve sua população acrescida em 12,5%, com um aumento da taxa de homicídios dolosos em 44%. Jaci-Paraná, distrito de Porto Velho mais próximo aos canteiros de obras, teve um aumento no registro de estupros na ordem de 76,8%, no mesmo período.


Os impactos decorrentes da construção de hidrelétricas também são o ponto principal analisado pelo artigo da subprocuradora geral da República Sandra Cureau. Relatando exemplos dos vários tipos de impactos, Cureau também trata dos impactos sobre o patrimônio o cultural, e, no quesito ameaças ao patrimônio arqueológico, cita riscos a sítios arqueológicos provocadas por projetos como os das hidrelétricas de Santa Isabel e Belo Monte.


A utilização da Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), área pioneira no campo de avaliação de impactos ambientais, é defendida pelos procuradores da República Wilson Rocha Assis e Emerson Kalif Siqueira e pelo promotor de Justiça Alexandre Lima Raslan. 


Definida com um processo sistemático para avaliar e antecipar as consequências de decisões adotadas antes do estágio de projetos, a AAE propõe-se a assegurar que as considerações e alternativas ambientais sejam analisadas na fase de planejamento, conjuntamente  com os fatores econômicos e sociais no desenvolvimento de políticas, planos e programas.


“O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o licenciamento de empreendimentos e atividades potencialmente poluidoras são instrumentos valiosos  que visam a inserir a variável ambiental no processo de tomada de decisão, mas que possuem uma ação limitada, pois subsidiam as decisões de aprovação de projetos de empreendimentos individuais, e não o processo de formulação de políticas públicas e estratégicas que os originam”, criticam os autores. 


Segundo o artigo, a AAE é citada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como o melhor instrumento de política ambiental para o país. A lógica da AAE, de se considerar a variável ambiental já no planejamento do projeto, contrariando a lógica que predomina atualmente, de se considerar o meio ambiente na fase de implantação, tem a possibilidade de aprimorar a gestão ambiental no caminho do desenvolvimento ambientalmente sustentável, destacam Assis, Siqueira e Raslan. “ A AAE permite, portanto, um enfoque predominantemente pró-ativo e que se considerem os impactos cumulativos dos diversos empreendimentos, objetivos dificilmente alcançáveis a partir do uso unicamente do EIA/RIMA [Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental]”.


Faça o download do livro em http://bit.ly/hidreletricasMP


Ministério Público Federal no Pará
Assessoria de Comunicação
(91) 3299-0148 / 3299-0177 / 8403-9943 / 8402-2708

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