quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Bancos desistem de projetos do Madeira


Crise financeira e riscos ambientais afetam apetite dos bancos em financiar as mega-hidrelétricas de R$ 21 bilhões

Santander e Banif enfrentam dificuldade em capitalizar fundo para Santo Antônio; Itaú já desistiu de Jirau e Santo Antônio

JULIO WIZIACK
AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os bancos estão revendo a decisão de financiar a construção das duas usinas do rio Madeira (Jirau e Santo Antônio), duas das mais importante obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Isso ocorre devido ao agravamento da crise financeira, que fez secar as fontes de recursos, e os riscos ambientais. Juntos, os projetos disputam, num dos piores momentos do mercado financeiro, o mesmo grupo de fontes para financiar R$ 21 bilhões, custo total das usinas.
O Santander e o Banif são sócios do consórcio vencedor da licitação para a usina de Santo Antônio. No grupo vencedor do leilão de Jirau, não há bancos entre os sócios, mas o Banco do Brasil lidera os financiadores.
Para erguer Santo Antônio, distante 7 km de Porto Velho (RO), Santander e Banif, que detêm 20% de participação do consórcio, decidiram formar um FIP (Fundo de Investimento de Participação).
Segundo Cássio Schmitt, executivo do Santander responsável pelo projeto, os bancos preparam sua saída do consórcio. "O fundo foi formado com esse objetivo", diz. "Queremos apenas prestar serviço como gestores."
Para isso, eles terão de vender cerca de R$ 500 milhões em cotas. Ainda segundo Schmitt, sete bancos, fundos de investimento e de pensão foram convidados a participar, mas nenhum fechou negócio até agora. Caso as vendas do FIP não se realizem, Santander e Banif continuam como "sócios" com obrigações de aportar recursos.
A Folha apurou que o Itaú foi convidado e negou a participação. O presidente do banco, Roberto Setúbal, foi procurado por representantes do consórcio para que mudasse sua decisão. Não mudou. O temor era o de que sua decisão afugentasse outros interessados.
Procurado, o Itaú não quis se pronunciar. O Ministério de Minas e Energia, a Casa Civil e o Ministério da Fazenda não ligaram de volta até o fechamento desta edição.
O próprio BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento), que prometeu financiar até 70% das obras de Santo Antônio, anunciou aporte de 60%. A reportagem apurou ainda que metade desses 60% será repassada por um grupo de bancos. Embora o dinheiro tenha origem no BNDES, a instituição quer diluir o risco da operação com o grupo.
A usina de Jirau, que fica a 136 km de Porto Velho (RO), é outro ponto de incertezas. Deslocada 9,2 km de seu local original, após o licenciamento ambiental, o projeto é contestado por várias ações judiciais.
Segundo Rogério Magno Panca, gerente-executivo de operações estruturadas do Banco do Brasil, nenhum contrato será assinado antes que uma consultoria independente avalie os riscos à luz dos "Princípios do Equador", um conjunto de regras definidas pelo Banco Mundial que norteiam a concessão de créditos.
Por essas normas, os signatários não podem financiar obras que ofereçam riscos ambientais ou afetem a vida de moradores locais, a menos que sejam feitas as adequações necessárias para mitigá-los. Signatário, o Banco do Brasil afirma que os questionamentos judiciais sobre os projetos terão de "ser equacionados" para a confirmação da operação.
A Folha apurou que o Itaú também negou o convite para participar de Jirau. O Santander é outro que decidiu ficar fora, de acordo com a ata de uma reunião ocorrida com a diretoria do banco, na Espanha, há cerca de um mês. No documento, estão expressos os riscos socioambientais decorrentes da mudança de local da usina.
Schmitt afirma que a proposta do Santander, enviada ao consórcio de Jirau, não foi competitiva em relação aos demais concorrentes e, por isso, as negociações ficaram congeladas.
O licenciamento das usinas é contestado pelo MPF (Ministério Público Federal). Não por acaso, os bancos Bradesco, Santander e Unibanco decidiram contratar uma consultoria independente, a ERM, para avaliar o projeto no que se refere aos Princípios do Equador. "Sem esse resultado, eles não avançarão", afirma Rubens de Oliveira Júnior, sócio da consultoria no Brasil.
A ERM avalia se o projeto da usina como está hoje se enquadra pelos Princípios. Pelos trâmites, se o consórcio responsável pelas obras não quiser fazer os ajustes, os bancos signatários dos Princípios não poderão participar. O estudo fica pronto no primeiro trimestre de 2009. "Estamos ainda na fase inicial", diz Oliveira Júnior. Bradesco e Unibanco recusaram-se a comentar o assunto.
Embora não seja signatário dos Princípios, o Santander decidiu implementá-los e está sendo assessorado pela equipe de risco ambiental do Real. Folha de S. Paulo

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